- Isto... é a árvore de Natal de Cristo - respondem-lhe. - Todos os anos, neste dia, há, na casa de Cristo, uma árvore de Natal, para os meninos que não tiveram sua árvore na terra...
"A ilusão é tão útil como a certeza: e na formação de todo o espírito, para que ele seja completo, devem entrar tanto os contos de fadas como os problemas de Euclides" - Eça de Queiroz
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
Conto: "A árvore de Natal na casa de Cristo"
- Isto... é a árvore de Natal de Cristo - respondem-lhe. - Todos os anos, neste dia, há, na casa de Cristo, uma árvore de Natal, para os meninos que não tiveram sua árvore na terra...
sexta-feira, 20 de novembro de 2009
Conto: "Os três carneirinhos"
"Há muito tempo atrás havia três carneirinhos que gostavam de subir a colina para encher as barriguinhas, e o nome de todos os três era "Gruff".
No caminho para a colina, havia uma ponte sobre um riacho que eles tinham que atravessar. E debaixo da ponte morava um troll horroroso, com olhos grandes como pratos e um nariz tão longo quanto um graveto.
Então, primeiro de todos, veio o carneiro mais novinho para cruzar a ponte.
- Trip, trap, trip, trap! - fez a ponte.
- Quem está trotando na minha ponte? - berrou o troll.
- Oh, sou eu, o menor dos carneirinhos Gruff, e eu estou subindo a colina para encher a minha barriguinha. - disse o carneiro, com uma voz bem baixinha.
- Ah, então agora eu vou encher a minha barriguinha com você! - disse o troll.
- Oh, não, por favor, não me devore! Eu sou muito pequenininho! - disse o carneiro. - Espere até que o segundo de nós venha. Ele é muito maior.
- Ah, está certo. - disse o troll - Pode ir embora!
Um pouco depois, chegou o segundo carneiro para cruzar a ponte.
- Trip, trap, trip, trap, trip, trap! - fez a ponte.
- Quem está trotando na minha ponte? - berrou o troll.
- Oh, sou eu, o segundo dos carneirinhos Gruff, e eu estou subindo a colina para encher a minha barriguinha. - disse o carneiro, com uma voz que não era tão baixinha como a do irmão caçula.
- Ah, então agora eu vou encher a minha barriguinha com você! - disse o troll.
- Oh, não, por favor, não me devore! - disse o carneiro. - Espere até que o mais velho de nós venha. Ele é muito maior.
- Ah, está certo. - disse o troll - Pode ir embora!
O maior carneiro de todos estava chegando bem naquela hora.
- Trip, trap, trip, trap, trip, trap! - fez a ponte, e o o carneiro era tão pesado que a ponte estalou debaixo dele.
- Quem está trotando na minha ponte? - berrou o troll.
- Sou eu, o grande carneiro Gruff, e eu estou subindo a colina para encher a minha barriga! - respondeu o maior de todos os carneirinhos, em uma voz que nada tinha de baixinha.
- Ah, então agora eu vou encher a minha barriguinha com você! - disse o troll.
- Pode vir! - respondeu o carneiro - Eu tenho dois chifres enormes e vou furar seus olhos, vou segurar e levantar você e jogar bem longe!
Aquilo foi o que o carneiro, que era o maior de todos, disse. E bem dito, bem feito. Ele correu até o troll, o agarrou com seus chifres e o jogou bem longe, lá embaixo no riacho. E depois disso, muito calmamente, atravessou a ponte e subiu para a colina, onde se juntou aos seus dois irmãos e encheu a barriga com a grama bem verdinha.
E o troll? Ah, ninguém nunca mais ouviu falar dele..."
***
Ilustração da capa do livro "The Three Billy-Goats Gruff", de Val Biro - Editora Star Bright Books, 1998 - ISBN 1887734465, 9781887734462 - 32 páginas
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
Conto: "O que significa trabalho em equipe"
MORAL DA HISTÓRIA:
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
Conto: "A flor da honestidade"
Sabendo disso, o príncipe resolveu fazer um concurso entre as moças da corte e anunciou que receberia, naquela noite, todas as pretendentes para lançar um desafio.
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Texto: "Quem hoje escreve já leu muuuito!" - Catarina Chagas
Quem hoje escreve já leu muuuito!
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Conto: "Eu o amo mais do que ao sal"
Há muitos anos atrás existiu um rei e sua rainha e eles tiveram três filhas.
O rei e a rainha amavam suas filhas com todo o coração, mas um dia a rainha ficou muito, muito doente. Ela foi definhando e morreu. O rei ficou muito triste por perder sua bela rainha, e suas filhas ficaram muito tristes por perderem a mãe.
Mas o rei reuniu as filhas, e disse-lhe:
- Escutem, crianças, sua mãe foi para um outro mundo e algum dia espero encontrar-me com ela outra vez. Mas o principal é que vocês devem ser felizes e entender que devo cuidar de vocês. E algum dia, quando eu morrer, uma de vocês será a rainha deste país.
Os anos se passaram e as três princesinhas cresceram. O rei gostava de caçar e de atirar, ele gostava de tudo; era um bom rei e seu povo, os súditos do país, o amavam muito. Mas uma noite o rei pensou consigo mesmo: "Os anos estão passando, estou ficando velho e não tenho um filho para suceder-me como rei. Uma de minhas filhas certamente deverá ser uma boa rainha. Mas qual? Qual será a melhor? sei que elas todas são carinhosas, amorosas, e muito boas. Mas terei de testá-las para ver qual é a mais apropriada para reinar depois de mim".
Então o rei, sendo um rei ocupado com todos os seus súditos e as coisas de seu país, não tinha muito tempo para passar com suas princesas. Ele as via todos os dias e jantava com elas e falava com elas, mas nunca teve uma conversa séria com elas. Então uma noite ele disse a seus cortesãos e a todos no palácio que queria ser deixado a sós, porque ele iria passar aquela noite com as filhas. Após o jantar, ele chamou as três princesas para se sentarem à sua volta.
- Agora, minhas jovens - disse ele - quero conversar com vocês. Sabem que já faz muito tempo que sua mãe morreu. E tenho feito o melhor, e todo mundo no palácio tem feito o melhor para criá-las e ensiná-las a fazer o que desejamos que sejam - jovens princesas deste reino. Realmente não tivemos uma conversa séria antes, mas hoje desejo saber qual de vocês será a rainha depois que eu morrer!
As princesas ficaram muito aborrecidas! Elas disseram:
- Papai, não desejamos ser rainhas, só queremos que você fique conosco para sempre!
Mas ele disse:
- É impossível ficar aqui para sempre, crianças. Algum dia terei de partir deste mundo. Encontrarei sua mãe num lugar muito distante e vocês ficarão sozinhas. Não quero discussão, disputa entre vocês três... Se pelo menos uma de vocês fosse diferente! Então - ele disse - amar a mim é amar a meu povo. Esta noite vou dar a vocês uma tarefa: quero que digam o quanto realmente me amam.
E perguntou primeiro à filha mais velha. E ela respondeu:
- Papai, eu amo você mais do que todos os diamantes, pérolas e jóias do mundo.
- Muito bem - disse ele - que ótimo!
Então ele perguntou à segunda filha:
- O quanto você me ama?
Ela disse:
- Eu o amo mais que todo ouro do mundo, eu o amo mais do que todo dinheiro que existe nesta terra.
Ele disse:
-Muito bem, isso é muito bom!
Chegou a vez da caçula, que era graciosa e bonita e só tinha quinze anos:
- Então - disse ele - caçulinha, o quanto você me ama?
- Bom, papai - ela respondeu - eu o amo mais do que ao sal.
- Você me ama mais do que ao sal? - ele repetiu.
- Sim, papai - ela disse - eu o amo mais do que ao sal.
E o rei ficou muito, muito aborrecido! Ele disse :
- Sua irmã me ama mais do que as jóias e diamantes, e sua outra irmã me ama mais do que todo o ouro deste mundo. Mas você - você me ama mais do que ao sal?! Bem, se é assim que você sente, eu não a amo! E amanhã cedo você vai embora, será banida daqui. eu não quero vê-la nunca mais! Você me desgraçou - a coisa mais baixa da terra é o sal!
O rei ordenou que na manhã seguinte ela fosse embora, encontrar seu próprio caminho no mundo, e nunca regressasse ao palácio. Ele estava tão aborrecido! Então a pobre princesinha ficou muito triste e de coração partido. Ela juntou uns poucos pertences... e suas irmãs riram e caçoaram dela. E ela foi mandada embora por ter desgraçado o pai.
A princesa andou, viajou, não tinha para onde ir. Ela viajou e viajou. E chegou a uma grande floresta e encontrou um pequeno caminho. Seguiu o caminho e pensou:
- Provavelmente esse caminho me levará a uma pequena aldeia ou a um pequeno povoado onde eu possa encontrar algum lugar para abrigar-me.
Mas o caminho a levou para o meio da floresta, a muitas e muitas milhas do palácio. Ali, ela viu uma pequena cabana. E a princesa pensou: "Provavelmente encontrarei abrigo aqui"
Ela aproximou-se da cabana e bateu na porta. E quando a porta se abriu, surgiu uma velha de cabelos brancos compridos e com um vestido todo rasgado. Ela disse:
- O que você está fazendo aqui, queridinha?
E a princesa disse:
- Bem, é uma longa história. Estou procurando abrigo para a noite.
- Mas para onde você vai depois? - perguntou a velha.
E a princesinha respondeu:
- Não vou para lugar nenhum. Vou... fui banida pelo meu pai.
- Seu pai? - perguntou a mulher.
- Sim - disse ela - meu pai, o rei!
- Seu pai, o rei... ele a expulsou? Conte-me essa história.
Então a velha acolheu a princesinha na cabana na floresta e deu-lhe algo para comer. E sentou-a perto do fogo. E sentadinho perto do fogo estava um grande gato preto. E o grande gato preto aproximou-se e pôs a cabeça no joelho da mocinha. Ela acariciou-o. Ele ronronou como um gatinho. A velha, quando viu isso, ficou surpresa e disse:
- Sabe, embora as visitas aqui sejam poucas, nunca ninguém que tenha estado aqui foi amigo do meu gato. Por isso, como ele distingue o bem do mal... você é boa! Conte-me a sua história.
Então a princesa contou-lhe a história sobre quando sua mãe morreu e ela foi criada pelo pai e passou a vida toda no palácio e então um dia seu pai chamou as filhas... E contou-lhe a história toda que já contei a vocês.
- Que tristeza. Seu pai está precisando de uma lição.
- Mas - ela retrucou- eu não posso voltar. Fui banida do palácio, meu pai nunca mais vai querer ver-me de novo.
A velha respondeu:
- Quem sabe, talvez algum dia ele ficará feliz em ver você!
Agora, voltando ao palácio, o rei vivia com suas duas filhas; a terceira tinha ido embora. E naturalmente o rei tinha suas refeições trazidas a ele. Trouxeram-lhe carne de vaca e de carneiro, e o rei adorava sua comida salgada.
Mas um dia, quando uma carne foi colocada na frente do rei, ele provou e de repente gritou:
- Tragam-me sal! - ordenou ao chefe e ao cozinheiro. - tragam-me sal!
Eles vieram tremendo:
- Meu senhor, não há sal - eles disseram.
O rei disse:
- Tire isso daqui, não posso comer sem sal! Traga-me outra coisa!
Então trouxeram-lhe coisas doces para comer. E trouxeram coisas doces no dia seguinte, no outro e no outro.
Mas o rei já estava cansado daquilo tudo. Ele disse:
- Tragam-me alguma carne, tragam-me um assado, um porco, algo que eu possa comer! Tragam-me comida, comida gostosa!
Os cozinheiros e os chefes trouxeram-lhe comidas gostosas, mas sem sal. O rei enviou mensageiros, enviou soldados, mandou todo mundo pelo país inteiro... Para as princesas estavam bem, elas adoravam comidas doces. Mas seu pai, o rei, não conseguia um grão de sal em todo o seu reino.
Na pequena cabana na floresta a princesa ficou com a velha, e tornaram-se amigas. Ela cozinhava e limpava para a velha, e o gato era seu melhor amigo. A velha amava a princesinha como nunca amara nada na vida. Mas um dia a velha voltou da floresta com uma cesta de ervas, que ela passara uma grande parte do dia a colher. Ela disse à princesa:
- Sabe, vou ficar triste amanhã.
E a princesa perguntou:
- Por que, avozinha, você vai ficar triste amanhã?
- Porque você vai deixar-me.
- Mas vovozinha, não quero deixá-la. Não tenho para onde ir.
A velha disse:
- Você precisa voltar para o seu pai.
A princesa retrucou:
- Mas não posso voltar ao palácio, porque meu pai me baniu.
- Já não mais. Olhe, dê-me seu vestido - e a princesa tirou o vestido.
A velha foi ao quarto e voltou em poucos minutos. Mas quando voltou, o vestido da princesa estava cheio de remendos e todo esfarrapado.
- Agora - disse ela à princesa - tire os sapatos.
A princesa tirou os sapatos. E a velha pegou uma tesoura e cortou o cabelo da princesa. A seguir ela foi perto do fogo e juntou um punhado de fuligem. E esfregou as cinzas no rosto da princesa.
- Agora - ela disse - você pode voltar para o seu pai.
- Fui banida, eu não... não posso voltar ao palácio!
- Você deve - disse a velha - porque você vai ser a próxima rainha!
- Eu, a próxima rainha? Uma de minhas irmãs é quem vai ser a próxima rainha; elas amam meu pai como ao ouro, elas amam meu pai como a diamantes.
- Mas - disse a velha - você ama seu pai mais do que ao sal! - e foi à cozinha e tirou uma pequena sacola de pano e encheu-a de sal.
- Agora - disse ela - tome isto e volte ao palácio. Tenho certeza de que será bem-vinda.
Então a princesa sabia que a velha estava falando a verdade, sabia que a velha tinha sido boa para ela. E disse:
- Lembre-se, eu voltarei!
- Volte - disse a velha - quando você for rainha! Vá para o palácio pelo mesmo caminho em que chegou aqui.
A princesa despediu-se da velha. Sabia que ela era uma bruxa. E que tinha destruído cada partícula de sal do país porque a princesa havia lhe contado sua história... e mesmo se alguém tivesse trazido sal de qualquer distância do palácio, o sal desapareceria, porque a velha bruxa havia posto um feitiço no palácio: nenhum sal poderia entrar ali.
A essa altura o rei estava ficando louco, ele não conseguia sentir gosto em nada - daria o seu reinado, por um grão de sal. Então, dois dias depois, quando ele estava clamando por sal e dizia que iria morrer se não comesse sal... chegou uma mendiga descalça no palácio. E o guarda parou-a e perguntou-lhe o que queria.
Ela disse:
- Quero ver o rei.
- Por que você quer ver o rei? - o guarda indagou.
- Bem - disse ela - eu trouxe um presente para o rei.
- O que poderia uma mendiga descalça trazer para o rei?
Ela respondeu:
- Eu trouxe uma sacola de sal.
E quando ele ouviu isso, rapidamente - ele não queria perder tempo - levou-a até o rei. E o guarda disse:
- Majestade, eu trouxe alguém para vê-lo.
Ela estava diante do rei, com o cabelo cortado, o rosto sujo de cinzas, descalça. E na mão trazia uma sacola.
O rei disse:
- Quem é essa mendiga esfarrapada que você trouxe aqui?
E os guardas, os cozinheiros, e todos estavam ansiosos; eles disseram:
- Majestade, o senhor não pode imaginar o que essa mendiga trouxe... ela trouxe algo muito especial!
- O que ela poderia trazer-me? - disse o rei. - Nada no mundo eu desejo: tenho ouro, tenho diamantes, tenho tudo...Mas se pelo menos eu pudesse ter um pouco de sal...
O guarda disse:
- Majestade, a mendiga trouxe-lhe uma sacola de sal.
- Oh, oh - disse o rei - ela trouxe... ela... traga-a aqui!
A princesinha aproximou-se do rei e disse:
- Aqui está...
O rei olhou dentro da sacola, colocou um dedo dentro da sacola e provou.
-Até que enfim - ele disse - Saaaal! A coisa mais maravilhosa do mundo! Melhor do que diamantes ou pérolas ou ouro ou qualquer coisa no meu reino! Por fim, posso comer.
Ele dirigiu-se à mendiga, e disse:
- O que você deseja? Você me trouxe a coisa mais preciosa deste mundo... O que você quer? Que tipo de recompensa deseja?
Ela voltou-se e disse:
- Pai, não quero nada!
E o rei disse:
- O quê?
Ela disse ao rei:
-Pai, não quero nada. Porque o amo mais do que amo ao sal.
Então o rei soube que a moça era sua filha mais jovem. Ele abraçou-a e beijou-a, e a fez mais do que bem-vinda. Ele descobriu a verdade: o sal era mais importante para ele do que qualquer coisa do mundo. E ela foi acolhida por todos no palácio. Quando o velho rei morreu ela tornou-se rainha e reinou sobre o país por muitos anos, e nunca se esqueceu de sua amiga, a velha da floresta. E assim termina minha história.
***
HUSAIN, Shahrukh. O Livro das Bruxas. Rio de Janeiro: Objetiva, 1993.
terça-feira, 13 de outubro de 2009
Matéria: "Hábito da leitura vem de berço"
Hábito da leitura vem de berço
Publicado em 11.10.2009
Bruna Cabral
bruna@jc.com.br
Era uma vez um menino que, desde cedo, descobriu nas letras sua brincadeira favorita. A princípio, o abecedário não fazia mais que aparar suas quedas. Era um tapete macio que decorava o quarto e aguçava a curiosidade do pequeno brincalhão. Depois, vieram os livrinhos de plástico para o banho e os de papel para todas as horas. Não demorou muito e os gibis viraram a companhia mais requisitada do menino que crescia cercado de letrinhas. Com uma forcinha da mãe e da avó, ele alfabetizou-se cedo. Aos 4 anos, já lia de tudo. E nunca mais parou. Seis anos depois, o menino já tem uma coleção enorme de livros na prateleira. E outra maior ainda no juízo.
Essa história é real e seu protagonista é Vinícius, filho da estilista Carol Azevedo, que lê, em média, sete livros por mês, das aventuras do bruxinho Harry Potter aos clássicos policiais estrelados por Sherlock Holmes. “Ele gosta de ser CDF. Dorme de óculos e já acorda lendo”, comemora a mãe, certa de que livros são escadas que Vinícius já começou a subir na vida. Aliás, certíssima. Segundo a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada entre novembro e dezembro de 2007 e divulgada no ano passado pelo Ibope Inteligência, um em cada três leitores adquire o hábito com os pais. Com 5 anos de idade em diante, 49% dos 5.012 entrevistados admitiram ter sido sua mãe a maior incentivadora da leitura por prazer.
Um papel que a pesquisadora Patrícia Bandeira de Melo, mãe de Pedro Antero, 8, assumiu sem economizar esforços. “Para mim, era essencial que ele gostasse de ler”, conta Patrícia, que apelou para o arsenal completo dedicado a iniciantes: dos tapetes com letras de plástico aos gibis.
“Também fiz questão de contar muitas histórias para ele dormir, das mais bobinhas a clássicos como O mágico de Oz.” O resultado não tardou a aparecer. Corujices maternas à parte, Pedro Antero é a criatividade ambulante. Vive encarnando os mais diversos personagens nas festinhas familiares e até já montou em casa uma verdadeira editora de gibis, na qual assume, sem reclamar das extenuantes jornadas de trabalho, os postos de editor, desenhista e roteirista. “De livro em livro, brincadeira em brincadeira, tenho certeza de que ele será um profissional diferenciado, seja lá qual for a carreira que escolher”, prevê a mãe.
Para Tomás Manzi, 10, a vida sem livros também seria inviável. Na verdade, pouquíssimo prazerosa. Leitor voraz, ele é do tipo que esquece até de tomar banho e comer quanto está no meio de uma boa história. “Às vezes, inventa de sair de casa com o livro debaixo do braço e, se eu não cuidar, ele atravessa a rua sem tirar o olho do texto”, conta a mãe Cristiane Gueiros, advogada e, não por acaso, fã incondicional dos mais diversos tipos de literatura. “Aqui em casa, quem leu primeiro a coleção inteira de Harry Potter fui eu”, conta Cristiane, que virou atração na escola dos filhos. “Até hoje as crianças ficam me perguntando coisas sobre os livros, tirando dúvidas. Elas acham o máximo um adulto gostar de Harry Potter.” A coleção, diga-se de passagem, já deixou de ser de Cristiane faz tempo. Tanto Tomás, quanto o irmão, Samuel, 7, já se renderam aos encantos do pequeno, aliás, ex-pequeno bruxo.
Mais que algumas histórias, o que Cristiane quer compartilhar com os filhos é um hábito. “Ficaria complicado dizer a Tomás e Samuel que eles precisam ler, se ninguém em casa tivesse o hábito.” O melhor exemplo, garante, é a prática.
E isso vale tanto para a leitura offline quanto para a online. “Eles navegam à vontade, mas estou sempre orientando. Digo que internet é como um martelo, que pode ser usado para bater um prego e pendurar um quadro na parede ou para meter na cabeça do colega e fazer um estrago enorme.” O valor de toda ferramenta, diz a mãe zelosa, depende do uso que a gente faz dela.
Um mérito inquestionável da internet, segundo a coordenadora pedagógica da escola Apoio, é fazer circular uma quantidade enorme de informações no mundo inteiro. “Nunca se teve tanto conhecimento à disposição como hoje”, diz. Melhor para as crianças, que têm a faca e o queijo na mão desde muito cedo, aliás, lazer e aprendizado. “A leitura desenvolve senso crítico, forma cidadãos mais pensantes, mais atuantes, além de ser um acesso para o que há de mais belo na humanidade”, diz Rejane, que, com a equipe de professores da escola, se desdobra em projetos para estimular a leitura.
Para os mais novos, são realizadas as rodas de leitura, em que são lidos e discutidos clássicos de Manuel Bandeira, Olavo Bilac e até Ítalo Calvino. “Engana-se quem pensa que criança digere só coisa boba.” Para os mais velhos, as professoras mandam livros para serem lidos e depois traduzidos em desenhos ou textos em casa. “Sem falar nas aulas de literatura”. Tudo culmina numa publicação com textos e ilustrações dos próprios alunos, editado ao final de cada ano.
Na escola Exponente, a leitura também é tão valorizada, que todos os estudantes têm aula na biblioteca a cada 15 dias. Uma das atividades prediletas de Luca Leitão, 5, e Frederico dos Santos, 4, que, apesar da pouca idade, já têm a foto estampada nos corredores do colégio como os leitores mais assíduos do mês. Dedicadíssimos aos livros, eles vivem na biblioteca e consideram os livros uma brincadeira das mais divertidas. De livro em livro, Luca já aprendeu a escrever o nome inteiro, antes mesmo de chegar à alfabetização. Seu predileto? “Todos de dinossauro”, diz, sem nem tirar os olhos de uma dessas publicações jurássicas. Com a ajuda dos livros, diz uma das coordenadora da instituição, Liane Niceas, a aquisição de conhecimento torna-se um processo mais prazeroso, que não fica restrito aos muros da escola.
É por isso que as professoras Patrícia Pompílio, Estela Santos e os filhos das duas não perdem uma edição que seja da Bienal do Livro de Pernambuco. A feira, que acaba amanhã, no Centro de Convenções, está repleta de atrações para a criançada em todos os estandes. E, principalmente, no primeiro andar, onde fica a Cidade do Livro, com contação de histórias e oficina de produção de publicações.
Publicado em 11.10.2009
1 A publicação é ilustrada em scanimation, que garante movimento às figuras. Ed. Sextante Infantil. Preço sugerido: R$ 24,90
2 De Valéria Belém, Feita de pano mostra que a vida é a costura de pequenos momentos. Da Companhia Editora Nacional. Preço sugerido: R$ 23
3 Conta a história de um lugar onde tudo é exagerado, o livro é ilustrado por Marcos Garutti. Editora Lazuli. Preço sugerido: R$ 16
4 Escritora Rosa Amanda Strausz, em Nico, fala de vaidade na infância. Editora Larousse. Preço sugerido: R$ 21,50
5 Primeira obra de Ziraldo, o livro foi relançado com capa nova. Editora Melhoramentos. R$ 59
6 Em pop up, a publicação conta – e monta – a história da arca de Noé. Da Sociedade Bíblica do Brasil. Preço sugerido: R$ 29,80
Link: http://jc3.uol.com.br/jornal/2009/10/11/not_350370.php
terça-feira, 29 de setembro de 2009
Prêmio SESC de Literatura
Inscrições até 30 de setembro de 2009!!!
O PRÊMIO
Revelar novos talentos e promover a literatura nacional são propósitos do Prêmio SESC de Literatura. Lançado pelo SESC em 2003, o concurso identifica escritores inéditos, cujas obras possuam qualidade literária para edição e circulação nacional. Além da divulgação das obras, o Prêmio SESC também abre uma porta do mercado editorial aos estreantes: os livros vencedores são publicados pela editora Record e distribuídos para toda a rede de bibliotecas e salas de leitura do SESC e SENAC em todo o país. Mais do que oferecer uma oportunidade a novos escritores, o Prêmio SESC de Literatura cumpre um importante papel na área de cultura, proporcionando uma renovação no panorama editorial brasileiro.
PARTICIPE
Aos autores iniciantes, que ainda não tiveram chance de mostrar ao público suas idéias e sua criação, este é o caminho. As inscrições para o Prêmio SESC de Literatura são gratuitas e aceitas em todo o Brasil. Basta procurar a unidade mais próxima do SESC na sua cidade. Cada concorrente pode participar com uma obra, nas categorias conto e romance. O vencedor terá seu livro publicado e distribuído pela editora Record. Participe! Esta pode ser a chance de sua obra chegar às principais livrarias do país. Confira as regras do concurso no edital.
Informações:
http://www.sesc.com.br/premiosesc/index.html
terça-feira, 15 de setembro de 2009
Conto: "O sermão de Nasrudin"
"Ó fiéis! Sabem o que vou lhes dizer?"
"Não, não sabemos", responderam em uníssono.
"Enquanto não saibam, não poderei falar nada. Gente muito ignorante, isso é o que vocês são. Assim não dá para começarmos o que quer que seja", disse o mullá, profundamente indignado por aquele povo ignorante fazê-lo perder seu tempo. Desceu do púlpito e foi para casa.
Um tanto vexados, seguiram em comissão para, mais uma vez, pedir a Nasrudin para fazer um sermão na sexta feira seguinte, dia de oração.
Nasrudin começou a pregação com a mesma pergunta de antes.
Desta vez, a congregação respondeu numa única voz: "Sim, sabemos."
"Neste caso", disse o mullá, "não há porque prendê-los aqui por mais tempo. Podem ir embora." E voltou para casa.
Por fim, conseguiram persuadi-lo a realizar o sermão de sexta feira seguinte, que começou com a mesma pergunta de antes.
"Sabem ou não sabem?"
A congregação estava preparada.
"Alguns sabem, outros não."
"Excelente", disse Nasrudin, "então, aqueles que sabem transmitam seus conhecimentos àqueles que não sabem."
E foi para casa.
***
Extraído do livro "Histórias de Nasrudin"
quarta-feira, 26 de agosto de 2009
Ziraldo estreia programa de incentivo à leitura
Desejando boa sorte a Ziraldo, a presidente da EBC – Empresa Brasil de Comunicação, jornalista Tereza Cruvinel, se referiu ao programa como o carro chefe de uma comitiva de novos programas da TV Brasil que, segundo ela, vai formar um comboio vitorioso.
“ Toda TV pública investe nas crianças e aqui não seria diferente. Queremos oferecer um programa de qualidade, principalmente para as crianças que não possuem TV paga”. Ao final, ela agradeceu a FBL Criação e Produção e ao Ziraldo, pela parceria com a TV Brasil.
Depois de mais uma apresentação musical das crianças que cantaram Tim Maia e João Bosco, foi a vez de Ziraldo falar:
“Esse programa não tem compromisso com o lucro, não queremos ganhar, queremos é levar algo diferente para as famílias. O ABZ do Ziraldo , assim como meus livros, não é feito somente para o público infantil. Meu trabalho é voltado para toda a família”.
“Meu sonho é tornar o Brasil um país de leitores. Ler é um prazer e não sacrifício. Espero, nessa altura da vida, e através deste projeto, ajudar a criança brasileira a não crescer analfabeta”, completou.
O ABZ do Ziraldo estreia neste domingo, 23, às 12h, na TV Brasil. Além do Coral Maluquinho o programa terá a presença de uma plateia formada por crianças da rede pública, escritores infantis e contadores de história que vão ajudar Ziraldo nesse novo trabalho voltado para a leitura.
sábado, 22 de agosto de 2009
Contação de estórias na Feira de Livros
Ontem fui contar estórias na Feira de Livros da Livraria Estudantil aqui em Caruaru. Foi uma aventura... hehehe... Eu tinha me preparado para me apresentar para crianças de 9 e 10 anos. Passei as últimas duas semanas selecionando o repertório e acabei me decidindo por um programa de quatro contos: "O Macaco e a Banana", de Câmara Cascudo; "Pedro Malasartes e a Sopa de Pedra", de Ana Maria Machado; "Quem tudo quer, tudo perde", de Câmara Cascudo; e "O Problema dos 35 Camelos", de Malba Tahan. Ensaiei o repertório, estava tudo nos trinques, certa de que ia ser muito legal, as crianças iriam se divertir muito. Qual não foi a minha surpresa ao entrar na livraria e ver um grupo de crianças de 3 a 5 anos? Ih... caraca... pensei. Teria que fazer uma mudança no programa. Ainda bem que, antes da minha apresentação, haveria um grupo de danças. Deu tempo para eu passar os olhos pelos livros e rapidamente refazer a minha programação.
domingo, 16 de agosto de 2009
Cigana Contadora de Estórias na Livraria Estudantil em Caruaru
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Conto: "O problema dos 35 camelos"
Encontramos perto de um antigo caravançará meio abandonado, três homens que discutiam acaloradamente ao pé de um lote de camelos.
Por entre pragas e impropérios gritavam possessos, furiosos:
- Não pode ser!
- Isto é um roubo!
- Não aceito!
O inteligente Beremiz procurou informar-se do que se tratava.
- Somos irmãos – esclareceu o mais velho – e recebemos como herança esses 35 camelos. Segundo a vontade expressa de meu pai, devo receber a metade, o meu irmão Hamed Namir uma terça parte, e, ao Harim, o mais moço, deve tocar apenas a nona parte. Não sabemos, porém, como dividir dessa forma 35 camelos, e, a cada partilha proposta segue-se a recusa dos outros dois, pois a metade de 35 é 17 e meio. Como fazer a partilha se a terça e a nona parte de 35 também não são exatas?
- É muito simples – atalhou o Homem que Calculava. – Encarrego-me de fazer com justiça essa divisão, se permitirem que eu junte aos 35 camelos da herança este belo animal que em boa hora aqui nos trouxe!
Neste ponto, procurei intervir na questão:
- Não posso consentir em semelhante loucura! Como poderíamos concluir a viagem se ficássemos sem o camelo?
- Não te preocupes com o resultado, ó Bagdali! – replicou-me em voz baixa Beremiz – Sei muito bem o que estou fazendo. Cede-me o teu camelo e verás no fim a que conclusão quero chegar.
Tal foi o tom de segurança com que ele falou, que não tive dúvida em entregar-lhe o meu belo jamal, que imediatamente foi reunido aos 35 ali presentes, para serem repartidos pelos três herdeiros.
- Vou, meus amigos – disse ele, dirigindo-se aos três irmãos -, fazer a divisão justa e exata dos camelos que são agora, como vêem em número de 36.
E, voltando-se para o mais velho dos irmãos, assim falou:
- Deverias receber meu amigo, a metade de 35, isto é, 17 e meio. Receberás a metade de 36, portanto, 18. Nada tens a reclamar, pois é claro que saíste lucrando com esta divisão.
E, dirigindo-se ao segundo herdeiro, continuou:
- E tu, Hamed Namir, deverias receber um terço de 35, isto é 11 e pouco. Vais receber um terço de 36, isto é 12. Não poderás protestar, pois tu também saíste com visível lucro na transação.
E disse por fim ao mais moço:
E tu jovem Harim Namir, segundo a vontade de teu pai, deverias receber uma nona parte de 35, isto é 3 e tanto. Vais receber uma nona parte de 36, isto é, 4. O teu lucro foi igualmente notável. Só tens a agradecer-me pelo resultado!
E concluiu com a maior segurança e serenidade:
- Pela vantajosa divisão feita entre os irmãos Namir – partilha em que todos três saíram lucrando – couberam 18 camelos ao primeiro, 12 ao segundo e 4 ao terceiro, o que dá um resultado (18+12+4) de 34 camelos. Dos 36 camelos, sobram, portanto, dois. Um pertence como sabem ao bagdáli, meu amigo e companheiro, outro toca por direito a mim, por ter resolvido a contento de todos o complicado problema da herança!
- Sois inteligente, ó Estrangeiro! – exclamou o mais velho dos três irmãos.
– Aceitamos a vossa partilha na certeza de que foi feita com justiça e equidade!
E o astucioso Beremiz – o Homem que Calculava – tomou logo posse de um dos mais belos “jamales” do grupo e disse-me, entregando-me pela rédea o animal que me pertencia:
- Poderás agora, meu amigo, continuar a viagem no teu camelo manso e seguro! Tenho outro, especialmente para mim!
E continuamos nossa jornada para Bagdá."
***
Glossário
Caravançará: refúgio construído pelo governo ou por pessoas piedosas à beira do caminho, para servir de abrigo aos peregrinos. Espécie de rancho de grandes dimensões em que se acolhiam as caravanas.
Bagdali: Relativo a Bagdá, vindo de Bagdá.
Jamal: uma das muitas denominações que os árabes dão ao camelo.
quarta-feira, 5 de agosto de 2009
Conto: "Dez anos de kest"
Dez anos de Kest
Interessante seria, meu bom amigo, iniciar este conto à maneira dos escritores clássicos israelitas, citando cinco ou seis pensamentos admiráveis, colhidos nas páginas famosas do Talmude. Como recordar-me, porém, dos trechos mais belos da Sabedoria de Isreel, quando é tão fraca, incerta e claudicante a minha memória? Vem-me apenas à lembrança, neste momento, um velho provérbio muito citado pelos judeus russos: “Quando o homem é feliz, um dia lhe vale um ano”.
A verdade contida nesse aforismo é indiscutível. E a história, que a seguir vou narrar, poderá servir para ilustrar a minha asserção.
Vivia em Viena, há mais de meio século, um jovem chamado David Kirsch, filho de um milômed, homem prudente e sensato. Kirsch adornava o seu espírito com uma qualidade bastante apreciável: não ousava tomar resolução alguma de certa relevância sem se sentir esclarecido e orientado pelos conselhos dos mais velhos. Seu judicioso pai lhe dera a seguinte recomendação:
— Cabe-me dizer-te, meu filho, que deverás evitar qualquer casamento quando do consórcio resultar aproximação, por parentesco, com um judeu vermelho.
Com a prudência que a longa experiência da vida sói ensinar aos homens, o pai acrescentara:
— Se algum dia, porém, por triste fatalidade, caíres nas garras de um judeu vermelho, procura sem demora o auxílio de outro judeu vermelho.
Quis o jovem David conhecer, mais por curiosidade do que por outro motivo, a razão de ser daquele estranho conselho, mas o velho milômed recusara-se terminantemente a dar qualquer explicação, alegando que tinha, para assim proceder, motivos que de consciência não poderia revelar.
O jovem David Kirsch foi procurado por um agenciador de casamentos. Trocadas as saudações habituais, o agenciador assim falou, assumindo como sempre um ar de máxima reserva e discrição:
— Como sei que pretendes resolver do melhor modo possível o problema de teu futuro, com a escolha de uma companheira digna, quero informar-te que obtive para o teu caso uma solução admirável. A noiva que tenho em vista é formosa, de família honesta e, além do mais, muito culta e prendada.
— E o dote? — indagou David, grandemente interessado, procurando tocar com a máxima finura naquele assunto tão delicado.
— Quanto ao dote — aclarou logo o agenciador, com um sorriso que traduzia o orgulho de bom profissional — está combinado que será de mil coroas, e terás ainda dez anos de kest.
— Dez anos de kest! — repetiu David, numa sinceridade de veemente surpresa. — Mas isto é espantoso, inacreditável!
Sou forçado a interromper a presente narrativa para dar ao leitor não-judeu, isto é, ao meu bom amigo gohin, um esclarecimento que me parece indispensável.
O kest é costume tradicional entre os judeus. O pai da noiva, além do dote (que é de uso também entre os cristãos), concede ao genro, a título de auxílio para iniciar a vida, a permissão de viver durante algum tempo em sua casa, sem fazer a menor despesa, quer com a alimentação, quer mesmo com o vestuário. Esse período, durante o qual o pai da jovem toma a seu cargo a subsistência completa dos recém-casados, é denominado kest, e em geral varia de um a três anos. Para um jovem egoísta, sem ânimo para a vida, pouco inclinado ao trabalho, a oferta de um kest prolongado constitui uma isca irresistível. Era esse, precisamente, o caso de David Kirsch, indolente como um falso mendigo, amigo da boa-vida e do feriado permanente.
Dez anos de kest! Um judeu sensato não poderia hesitar. A cerimônia do noivado, com a clássica apresentação das famílias, foi marcada para alguns dias depois.
Quando David Kirsch foi levado à presença da sua noiva, ficou maravilhado. O agenciador não o havia iludido, pintando com as cores vivas do exagero os encantos da noiva prometida. A menina era uma judia realmente graciosa, esbelta, cheia de vida, e os dez anos de kest emprestavam-lhe ao olhar, ao sorriso e aos lábios todos os ímãs inconcebíveis da beleza. Rebla, a filha do rei de Gorner, não parecera mais sedutora aos olhos do grande Salomão. Dela diria certamente o poeta: “De longe parece uma estrela; de perto, uma flor”.
Dolorosa foi, porém, a surpresa do noivo judeu ao defrontar, pela primeira vez, com o seu futuro sogro. Pela cor fulva dos cabelos, pelas sardas que repintavam o carão avermelhado, era o velho um tipo perfeito e inconfundível de judeu vermelho.
Naquele momento, invadido por negrejante inquietação, recordou-se David do conselho que a prudência paterna lhe ditara: “Evitar qualquer aproximação, pelo casamento, com um judeu vermelho”. Mas que fazer, naquela dependura? A sua palavra estava dada. Ademais, acima de qualquer compromisso, esmagando dúvidas e receios, os dez anos de kest constituíam um argumento irrespondível, diante do qual desapareciam todos os motivos que militavam contra o consórcio que se lhe afigurava tão promissor.
Pouco tempo depois realizou-se o enlace nupcial, e o jovem passou a viver com sua adorada esposa o seu belo período de kest, em casa do rico judeu vermelho.
— Esse judeu vermelho — pensou David, altamente desconfiado com o caso — alguma peça desagradável prepara para mim. Custa-me acreditar que ele mantenha essa liberalíssima promessa dos dez anos de kest. Naturalmente terei, em sua casa, um tratamento tão vil e humilhante, que nem mesmo um cão seria capaz de aturar, e ao fim de dois ou três meses, é certo, serei forçado, pela situação, a procurar outro pouso e trabalho. Alguma perfídia o meu sogro já planejou contra mim!
Com grande espanto, entretanto, o jovem David verificou que o pai de sua esposa era de um feitio que desmentia por completo seus temores e desconfianças. O judeu vermelho mostrava-se delicado e afetuoso, e dispensava ao seu novo genro um tratamento principesco. Fazia multiplicar os pratos saborosos nas refeições, proporcionava-lhe passeios agradabilíssimos, dava-lhe roupas finas e enchia-o de presentes valiosos.
— Meu pai não tinha razão — meditava o jovem, refletindo sobre a vida regalada e invejável que desfrutava em casa de seu sogro. — Que outro marido poderá ser mais feliz do que eu? Minha esposa é encantadora; por longo prazo, sem o menor trabalho, preocupação ou contrariedade, terei nesta casa mesa sempre lauta, agasalho, carinho e consideração!
Ao cabo de alguns dias o velho judeu vermelho chamou o indolente marido de sua filha e interpelou-o, muito sério:
— Dize-me, ó David: és, na verdade, feliz na tua nova situação de homem casado e chefe de família?
— Muito feliz, meu sogro — confirmou o jovem, num retraimento de espanto. — Sinto-me aqui incomparavelmente feliz.
— Se assim é, o teu kest está terminado!
— Terminado o meu kest? — protestou atônito o marido parasita. — Mas se eu estou casado há pouco mais de uma semana! Como pode ser isto?
— Como pode ser? Nada mais simples. Vou provar claramente. Estás casado com minha filha há dez dias. Bem sabes que no livro dos provérbios encontramos exarada esta sentença: “Quando um homem é feliz, um dia vale um ano”. Logo, de acordo com esse tradicional provérbio, estás casado há dez anos! Amanhã, portanto, levarás de minha casa tua esposa e irás para a tua residência. Creio que deverás também procurar um emprego, um meio qualquer de vida, pois de mim já recebeste o necessário auxílio, o dote e o kest prometidos.
Diante da imposição do sogro, David sentiu-se presa de grande furor. Quis apresentar argumentos que militavam em seu favor, mas o astucioso judeu vermelho manteve-se intransigente, e não houve como levá-lo a reconsiderar a resolução que havia tomado, insistindo em afirmar que nada mais fazia senão atender à verdade contida no provérbio: “Quando o homem é feliz, um dia vale um ano”.
Não se conformava o rapaz com a idéia de ser obrigado a trabalhar para viver; e a situação a que fora atirado envenenou-lhe o espírito com todas as toxinas do rancor. Tinha sido indigno, a seu ver, o proceder do sogro. Prometera-lhe, sob palavra, dez anos de kest, e depois, por evidente má-fé, baseando-se num idiota brocardo judeu, reduzira o prazo a dez dias. Que tratante! Um grande velhaco! Quando o interesse estava em jogo, sabia transformar um simples provérbio em lei social!
— Meu pai tinha razão — murmurou David, recalcando os seus rancorosos impulsos. — Toda razão tinha meu pai. Pratiquei uma imprudência muito séria, fazendo-me surdo aos conselhos daquele que melhor do que eu deve conhecer a vida e os filhos de Israel.
Resolvido a não incidir uma vez mais no erro, o jovem recordou-se da segunda parte do conselho paterno, e foi, nesse mesmo dia, procurar um conhecido seu chamado Elias Bloch, também judeu vermelho, e pediu-lhe indicasse um meio que lhe permitisse sair da situação crítica em que se encontrava.
O inteligente Elias Bloch atendeu com amabilidade o jovem David, e depois de ouvir o minucioso relato da burla do kest, expediu uma risadinha seca e maldosa, e respondeu com um relâmpago de inspiração no olhar:
— Não vejo dificuldade alguma em resolver o teu caso. Irás amanhã à casa de teu sogro, e se seguires as minhas instruções, sairás vencedor nesse litígio.
No dia seguinte, David Kirsch, tendo nas mãos um exemplar da Torá — que é o livro da lei, entre os hebreus — foi ter à rica vivenda do seu astucioso sogro.
Depois de saudá-lo com certa reserva e cerimônia, como se as relações entre ambos estivessem profundamente abaladas, assim falou com teatral entonação:
— Por motivos muito graves sou forçado a vir agora à sua presença. Vou divorciar-me!
Divórcio! Esta palavra, para a família judaica, representa uma desgraça só comparável às maiores calamidades.
— Estás louco, rapaz! — protestou o velho, empalidecendo ligeiramente. — Bem sabes que o divórcio só pode ser obtido segundo a lei de Moisés. Que motivo poderá ser aduzido para justificativa dessa nódoa infamante com que pretendes golpear a minha família?
— Tenho a lei a meu favor. Como o senhor mesmo declarou e provou, vivi em sua companhia os dez anos de kest. Os doutores e rabis não ignoram que o Livro da Lei de Moisés diz com a maior clareza: “Quando a mulher não concebe ao fim de dez anos, o marido pode requerer o divórcio”. Ora, estou casado há dez anos e não tenho filhos; cabe-me, portanto, segundo a lei, o direito de repudiar minha esposa.
— Que brincadeira é essa, meu filho! — retorquiu o judeu vermelho, emergindo da sua estupefação e abraçando amavelmente o genro. — Afastemos de nós as idéias tristes, pois já não foi pequeno o susto com que abalaste meu coração de pai. Fizeste mal em tomar a sério o meu gracejo sobre o tal provérbio dos dias felizes. E se assim é, fica o dito pelo não-dito. Se eu prometi dez anos de kest, é certo que poderás viver todo esse tempo em minha casa.
E concluiu, com um gesto convencido e superior, passando lentamente a mão pelos cabelos avermelhados:
— Jamais deixei, menino, como bom judeu, de cumprir a palavra dada.
***
Fonte: Malba Tahan, Lendas do Povo de Deus – Ed. Conquista, Rio de Janeiro, 1964
Imagem: blog Pensando Alto
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
Texto: "Formas de apresentação das histórias"
Este ano, estou ainda fazendo a seleção do que quero contar. Uma estória que fez bastante sucesso com a criançada foi a da "Rainha Rabo de Macaco", do Roberto Carlos Ramos, esse contador de estórias mineiro, cuja vida virou um filme que entrará em cadeia nacional de cinemas no dia 07 deste mês.
Estudar uma história é ainda escolher a melhor forma ou o recurso mais adequado para apresentá-la. Os recursos mais utilizados são:
1. A simples narrativa;
2. A narrativa com o auxílio do livro;
3. O uso de gravuras, de flanelógrafos, de desenhos;
4. Narrativa com interferência do narrador e dos ouvintes.
1- SIMPLES NARRATIVA
Mais fascinante de todas as formas, a mais antiga, mais tradicional e autêntica expressão do contador de histórias.
Não requer nenhum acessório e se processa por meio da voz do narrador, de sua postura. Este, por sua vez, com as mãos livres, concentra toda a sua força na expressão corporal. Lendas, fábulas e histórias recolhidas da tradição oral são melhor transmitidas sob a forma de simples narrativa e ainda é a maneira que mais contribui para estimular a criatividade. A utilização de material ilustrativo nos exemplos citados, poderia desviar a atenção do ouvinte, que deve estar fixa no narrador.
2 - COM O LIVRO
Há textos que requerem, indispensavelmente, apresentação do livro, pois a ilustração os complementa. Examinando-se livros onde se destaca a apresentação gráfica e a imagem é tão rica quanto o texto, verifica-se a propriedade do recurso.
Essa apresentação, além de incentivar o gosto pela leitura (mesmo no caso dos ainda não alfabetizados) contribui para resolver a sequência lógica do pensamento infantil.
Devemos mostrar o livro para as crianças virando lentamente as páginas com a mão direita, enquanto a esquerda sustenta a parte inferior do livro.
Narrar com o livro não é propriamente ler a história. O narrador a conhece, já a estudou e a vai contando com suas próprias palavras, sem titubeios, vacilações ou consultas ao texto, o que prejudicaria a integridade da narrativa.
3 - COM DESENHOS
É um recurso atraente no caso de histórias de poucos personagens e traços rápidos. Pode ser desenhado no quadro de giz ou papel de metro.
Aguça a curiosidade dos ouvintes.
4 - COM GRAVURAS
As gravuras favorecem, sobretudo, as crianças pequenas, permitem que elas observem detalhes e contribuem para a organização do pensamento. Isso lhes facilitará mais tarde a identificação da ideia central, fatos principais, fatos secundários, etc.
Antes da narrativa, empilham-se as gravuras em ordem viradas para baixo. À medida que vai contando, o narrador as coloca uma a uma no suporte próprio.
5 - COM O FLANELÓGRAFO
Este recurso é ideal para ser usado nas histórias em que a personagem principal entra e sai de cena, movimenta-se num vai e vem durante o enredo.
Na gravura reproduz-se a cena. No flanelógrafo, cada personagem é colocado, individualmente, ocupando seu lugar no quadro, o que dá a ideia de movimento.
O mais importante nessa técnica é a ação do personagem principal, num movimento constante.
6 - COM INTERFERÊNCIAS DO NARRADOR E DOS OUVINTES
Seja qual for a forma de apresentação, pode-se introduzir a interferência, se o texto a requer ou sugere.
A interferência resulta da criatividade do narrador, que a incorpora ao texto para tornar a narrativa mais atraente. É um excelente recurso quando se trata de público numeroso, em locais abertos, facilitando a concentração dos ouvintes. No entanto, é preciso cuidado para não transformá-la em programa de auditório, pois ela deve surgir em decorrência do enredo e ser mantida em equilíbrio sob o controle do narrador.
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Imagem do blog Peregrina Cultural
quinta-feira, 23 de julho de 2009
Filme "O contador de histórias"
Leia a sinopse, divulgada pela assessoria de imprensa do filme:
“O Contador de Histórias”
Ele era considerado um menor irrecuperável - até encontrar afeto.
O surpreendente percurso do mineiro Roberto Carlos Ramos poderia ser mais uma das muitas histórias que ele inventava desde criança para driblar a realidade, como transformar a chegada a uma instituição para menores em uma ida ao circo, a movimentação de um assalto de rua em animado jogo de futebol ou a robusta professora de educação física em um hipopótamo de couro azul remendado.
No entanto, a história real do garoto ‘irrecuperável’, analfabeto até os 14 anos e com mais de uma centena de fugas no currículo, é ainda mais tocante: o encontro com a pedagoga francesa Margherit Duvas acrescentou elementos essenciais e até então inexistentes em sua vida ou em seus relatos tão inventivos, como afeto, confiança, esperança.
O Contador de Histórias, com direção de Luiz Villaça (Por Trás do Pano, Cristina Quer Casar), traz para o cinema com emoção, lirismo e humor, a história deste encontro que começou com duas expressões que Roberto, apesar do farto vocabulário aprendido na instituição e nas ruas, jamais ouvira: “com licença’ e ‘por favor’. Palavras que começaram a mudar a vida de um menino e, que hoje, 30 anos depois, continuam a mudar a vidas de muitos outros meninos.
A atriz franco-portuguesa Maria de Medeiros (Pulp Fiction – Tempo de Violência, Henry & June, Capitães de Abril) interpreta Margherit Duvas. Roberto Carlos é interpretado por Marco Ribeiro (6 anos), Paulinho Mendes (13 anos) e Clayton Santos (20 anos), escolhidos entre mais de 500 candidatos selecionados em escolas e projetos sociais de Minas Gerais, sob coordenação de Lais Corrêa, atriz e preparadora de elenco. Malu Galli, Jú Colombo e Chico Diaz também integram o elenco.
Roberto Carlos Ramos hoje é educador
Com roteiro de Mauricio Arruda, José Roberto Torero, Mariana Veríssimo e Luiz Villaça, o filme tem fotografia de Lauro Escorel e música de André Abujamra e Márcio Nigro.
Uma produção de Francisco Ramalho Jr. e Denise Fraga.
Com Distribuição da Warner Bros. e sob os auspícios da Unesco, O Contador de Histórias tem estreia nacional no dia 7 de agosto.
5
LONGA-METRAGEM 35mm
Duração: 110 minutos
Ano Produção 2009
Produtora RAMALHO FILMES e NIA FILMES
Conto: "O semeador de tâmaras"
Esta versão vem do livro El saber es más que la riqueza, de Silvia Dubovoy O semeador de tâmaras Em um oásis perdido no deserto, o velho El...
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Esta estória me foi contado pelo meu pai há duas semanas. Sabedor que coleciono causos e contos do folclore nordestino, ele me narrou que ...
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Já estou na 29ª semana da minha gestação. Pesada demais e sem fôlego para minhas apresentações. Principalmente porque gosto muito de me move...
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Diz que o Pedro Malasartes estava morando numa pequena cidade. Ele, que era um grande viajante, resolveu ficar naquele lugarejo por um ...