segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Conto: Presentes de Natal

Este lindo conto veio do site Bedtime Stories, de Pedro Pablo Sacristán, e eu o traduzi, adaptei e contei para um mundo de crianças e adultos, inclusive na Seresta Natalina do Alto do Moura, um lindo bairro de artesãos de Caruaru, conhecida como a Capital do Forró, famosa pela sua feira, pela sua arte no barro e, claro, pelas festas de São João. Aprovado por todos, compartilho aqui com o coração cheio de alegria pela linda data. Feliz Natal para todos!
OS maiores fabricantes de brinquedos do mundo reunidos na Conferência de Natal
(ilustração de Jaime Espinar Muñoz.)
"Naquele ano, a Conferência de Presentes de Natal estava cheia de transbordar. Na plateia estavam todos os fabricantes de brinquedos no mundo, e muitos outros que não eram fabricantes de brinquedos, mas que ultimamente vieram a ser participantes regulares. Houve também aqueles que, é claro, nunca poderiam perder a conferência; os distribuidores: Papai Noel e os Reis Magos.
Como todos os anos, as discussões lidavam com o tipo de brinquedos mais educativos ou divertidos. Outro tópico comum de conversa era o tamanho em que os brinquedos deveriam ser feitos. Sim, isso era algo sobre que eles frequentemente não se entendiam, porque os Reis Magos e o Papai Noel queixaram-se de que todos os anos os brinquedos estavam ficando maiores e isso estava causando sérios problemas de transporte.
No entanto, algo aconteceu para tornar esta conferência diferente de todas as anteriores. Um menino esgueirou-se e entrou no salão. Nunca criança alguma havia assistido a uma dessas reuniões e quando perceberam que havia um menino sentado ao lado dos Três Reis, ninguém soube dizer realmente há quanto tempo ele estava lá.
Quando Papai Noel estava falando com um importante fabricante de brinquedos sobre o tamanho de uma boneca muito procurada, o homem berrou:
- "Do que você está falando, gorducho?! Se você fosse um pouco mais magro, poderia encaixar mais brinquedos no trenó!"
O menino viu isso, levantou-se e disse:
- "Está tudo bem, não discutam. Eu entregarei tudo o que os Reis Magos e o Papai Noel não puderem carregar."
Os participantes caíram em estrondosa gargalhada e descartaram a sugestão do menino. Enquanto eles ainda estavam rindo, o menino se levantou, uma lágrima caiu do canto do seu olho, e ele saiu do salão cabisbaixo...
Esse Natal foi como a maioria dos outros, um pouco mais frio talvez. Na rua, todos continuavam com suas vidas e nem contavam as histórias e eventos maravilhosos daquela época. E quando as crianças receberam seus presentes, elas nem se ligaram. Parecia que o Natal perdera toda a importância.
Na próxima Conferência de Presentes de Natal, todos estavam preocupados sobre como o Natal parecia estar perdendo sua magia. As discussões começaram mais uma vez, até que de repente apareceu, na porta, o menino de que eles tinham caçoado tanto no ano anterior. Desta vez ele estava com sua mãe, uma linda mulher. Ao vê-la, os Três Reis saltaram de emoção:
-"Maria!"
Eles correram e a abraçaram. Então ela se aproximou do palco, pediu a palavra e disse:
- "Todo ano, meu filho celebrava seu aniversário dando uma grande festa - a maior do mundo - e ele a enchia com seus melhores presentes para crianças e velhos. Agora ele me diz que não quer mais comemorar, que nenhum de vocês realmente gosta de sua festa, que vocês estão mais interessado em outras coisas... Alguém pode me dizer o que foi que fizeram com ele?"
A maioria dos presentes começou a perceber o que eles tinham feito, e onde eles ficaram tão confusos. Um velho fabricante de brinquedos - alguém que nunca tinha falado naquelas reuniões - aproximou-se do menino, ajoelhou-se e disse:
- "Perdoe-me, Senhor. Eu não quero nenhum outro presente além daqueles que você oferece. Embora eu nunca tivesse percebido isso, você estava sempre entregando aquilo que nem os Reis, nem o Papai Noel, nem ninguém, poderia nos dar: amor, paz e alegria. E no ano passado fizeram uma falta tremenda ... me perdoe... ".
Um após o outro, todos foram lá pediram perdão ao menino, admitindo que seus presentes eram os melhores disponíveis em qualquer época festiva; presentes que preenchem os corações das pessoas boas, presentes que tornam cada Natal um pouco melhor...".





quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Conto: "Bula, o viajante"

Bula, o viajante - ilustração de Jaime Espinar
Muitos anos atrás, um grande senhor chamado Bula reconheceu sinais nos céus; sinais que nunca haviam sido vistos antes. Esses presságios anunciaram a chegada do maior rei que o mundo jamais conhecera. Espantado com a perspectiva de tal poder, o rico senhor decidiu partir em busca deste rei, com a intenção de se colocar a seu serviço e assim alcançar uma posição de importância em seu futuro reino.
Reunindo todas as suas riquezas, ele formou uma grande caravana e foi para onde os sinais indicavam. Mas o poderoso senhor não havia se dado conta de quão dura e longa seria a jornada.
Muitos de seus servos adoeceram e o bom senhor cuidou deles, gastando grande fortuna em curandeiros e médicos. Eles atravessaram um país tão seco que os habitantes estavam morrendo de fome às dúzias. O senhor permitiu que essas pessoas se juntassem ao comboio e lhes forneceu alimentos e roupas.
Eles se encontraram com grupos de escravos que eram tão horrivelmente maltratados que o senhor decidiu comprar sua liberdade, o que lhe custou grandes quantidades de ouro e joias. Os escravos, agradecidos, se juntaram ao grupo de Bula.
Tão longa foi a jornada e tantas pessoas acabaram se juntando ao comboio, que quando eles finalmente chegaram ao seu destino, havia restado apenas uma pequena parte das joias; joias que o senhor quis guardar como um presente para o grande rei. Bula então descobriu o último sinal: uma grande estrela brilhante, erguendo-se de trás de algumas colinas, e ele se dirigiu a ela com o que restou de suas riquezas.
"Bula viu o último sinal: uma grande estrela brilhante"
Ele caminhou em direção ao palácio do grande rei e encontrou muitos viajantes mas, contra suas expectativas, poucos deles eram pessoas nobres e poderosas; a maioria deles eram pastores, lavradores e mendigos. Vendo seus pés descalços e pensando no pouco uso que um rei tão poderoso teria para suas poucas riquezas, Bula acabou compartilhando o pouco que restou de suas joias com essas pessoas pobres.
Sem dúvida, seus planos deram errado. Agora ele não podia nem pedir uma posição no novo reino. Bula pensou em se virar e voltar para casa, mas ele tinha passado por tanta coisa para chegar lá que não queria sair sem pelo menos ver o novo Rei do Mundo.
Então ele continuou andando e viu que depois de uma curva a estrada chegava ao fim. Não havia sinal de palácios, soldados ou cavalos. Tudo o que ele podia ver era um pequeno estábulo ao lado da estrada, onde uma família pobre estava tentando se proteger do frio. Bula ficou desapontado por ter se perdido de novo, e ele se aproximou do estábulo, com a intenção de perguntar a essas pessoas se elas sabiam o caminho para o palácio do novo rei.
"Eu trago uma mensagem para ele", explicou ele, mostrando-lhes um pergaminho, "Eu gostaria de servi-lo e ter uma posição importante em seu reino."
Ao ouvir isso, todos sorriram, especialmente um bebê recém-nascido que estava deitado em uma manjedoura. A senhora no estábulo estendeu a mão e pegou o pergaminho, dizendo:
"Dê-me a mensagem, eu o conheço e darei a ele pessoalmente."
E ela entregou o pergaminho à criança que, ao som da risada de todos, apertou-o com as mãozinhas e o mordiscou, deixando-o todo estragado.
Bula não achou isso engraçado. Percebendo que agora ele não tinha praticamente nada, ele caiu no chão, chorando amargamente. Enquanto ele chorava, a mão do bebê tocou seu cabelo. O senhor levantou a cabeça e olhou para a criança. Ele estava sorrindo silenciosamente, e era um bebê tão adorável que Bula logo esqueceu seus problemas e começou a brincar com ele.
E lá ficou ele, quase a noite toda, na presença da pobre família, contando-lhes sobre suas viagens e aventuras e compartilhando com eles o pouco que lhe restava. Quando amanheceu, Bula se preparou para sair, se despedindo de todos e beijando o bebê. A criança, sorrindo como ele havia feito a noite inteira, pegou o pergaminho encharcado e enfiou-o no rosto de Bula, fazendo todos rirem. Bula pegou o pergaminho e o guardou como lembrança daquela encantadora família.
Naquele dia ele começou sua jornada para casa.
Vários dias depois, lembrando-se de sua noite no estábulo, encontrou o pergaminho entre as roupas e abriu-o. A saliva do bebê não deixara rastros da mensagem original. Mas naquele exato momento, enquanto olhava para o papel vazio, gotas de água e ouro enchiam o ar em volta do pergaminho e lentamente pousaram nele. E com lágrimas de felicidade rolando por suas bochechas, Bula leu:

"Eu recebi sua mensagem.
Obrigado por ter vindo e por todos os presentes que você trouxe para meus amigos, que você conheceu no caminho. Eu lhe garanto que você já tem uma ótima posição no meu reino.
Assinado: Jesus, Rei dos Reis"


Fonte: Pedro Pablo Sacristán (Bedtime Stories )
Imagem: Jaime Espinar Muñoz
Tradução: Gabriela Kopinits

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Conto: "O que o Velhinho faz está sempre certo" - Hans Christian Andersen

Em homenagem ao Dia de Ação de Graças, celebrado neste 22 de novembro, trago um lindo conto do mestre Hans Christian Andersen sobre o coração puro e leve de quem sempre reconhece as bênçãos que a vida traz, traduzido da versão em inglês publicada no Centro Hans Christian Andersen, do Departamento para o Estudo da Cultura da University of Southern Denmark, devotada ao estudo e resgate da extensa obra do escritor.
Ilustração do dinamarquês Hans Tegner (1872)
"Agora vou contar uma história que ouvi quando eu era um garotinho e que gosto mais e mais cada vez que penso nela. Pois é o mesmo com histórias que com muitas pessoas; quanto mais velhos eles ficam, mais agradáveis ​​eles se tornam, e isso é maravilhoso.

Você esteve no campo, é claro. Lá você deve ter visto uma antiga casa de fazenda com telhado de palha, onde musgo e mato se plantaram; um ninho de cegonha decora a chaminé (você nunca pode ficar sem a cegonha); as paredes são inclinadas; as janelas são baixas (na verdade, apenas uma delas foi feita para abrir); o forno se sobressai como um estômago pequeno e gordo; e um sabugueiro se inclina sobre o portão, onde você pode ver um pequeno lago com um pato ou patinhos, debaixo de um salgueiro retorcido. Sim, e depois, claro, há um cão de guarda que late a todos e a tudo.

Bem, havia uma fazenda exatamente assim no campo, e nela moravam duas pessoas, um fazendeiro e sua esposa. Eles tinham poucas posses , mas ainda havia algo de que eles poderiam abrir mão, e isso era um cavalo, que pastava ao longo da vala ao lado da estrada. O velho fazendeiro usava-o para ir à cidade e emprestá-lo aos seus vizinhos, recebendo alguns serviços leves em troca, mas ainda assim seria muito mais lucrativo vender o cavalo, ou pelo menos trocá-lo por algo que fosse mais útil para eles.

Mas o que eles deveriam fazer, vender ou trocar?

"Você saberá o que é melhor, Pai", disse a esposa. "É dia de mercado. Vamos lá, vá para a cidade e ganhe dinheiro para o cavalo, ou faça um bom negócio com ele. O que quer que você faça está certo; então, saia para o mercado!"

Então ela amarrou seu lenço de pescoço - pois era algo que ela entendia muito melhor do que ele - amarrou-o com um laço duplo e o fez parecer bem elegante. Escovou o chapéu com a palma da mão e beijou-o na boca e, em seguida, lá se foi ele, montando o cavalo que seria vendido ou trocado. Claro, ele saberia a coisa certa a fazer.

O sol estava abrasador e não havia uma nuvem no céu. A estrada estava empoeirada e cheia de pessoas a caminho do mercado, algumas em carroças, algumas a cavalo e outras em suas próprias duas pernas. Sim, era um sol forte, sem sombra durante todo o caminho.

Agora veio um homem levando uma vaca, uma vaca tão bonita quanto você gostaria de ver. "Tenho certeza de que ela deve dar um bom leite", pensou o camponês. "Seria uma boa pechincha se eu a pegasse. Ei, você com a vaca!" ele disse. "Vamos conversar um pouco. Olhe aqui, acredito que um cavalo custa mais do que uma vaca, mas isso não importa para mim, já que tenho mais utilidade para uma vaca. Vamos fazer uma troca?"

"De acordo", disse o homem com a vaca; e então eles trocaram.

Agora o fazendeiro poderia ter voltado para casa novamente, pois ele havia concluído o seu negócio. Mas ele planejava ir ao mercado, então, para o mercado ele iria, mesmo que apenas para olhar; portanto, com sua vaca, ele continuou seu caminho. Ele andava depressa, assim como a vaca, e logo alcançaram um homem que conduzia uma ovelha; Era uma ovelha de boa aparência, em bom estado e bem fornida de lã.

"Eu certamente gostaria de ter isso", pensou o camponês. "Ela teria muito pasto ao lado de nossa vala, e no inverno poderíamos mantê-lo em nosso próprio quarto. Seria realmente muito mais sensato mantermos uma ovelha do que uma vaca. Podemos trocar?"

Sim, o dono da ovelha estava bem disposto, então a troca foi feita e agora o fazendeiro continuava pela estrada com sua ovelha. Perto de um portão da estrada ele encontrou um homem - o guarda do pedágio - com um grande ganso debaixo do braço.

"Bem, você tem um belo companheiro pesado aí!" disse o fazendeiro. "Tem muitas penas e gordura! Como seria bom amarrá-la perto de nosso pequeno lago e, além disso, seria algo para quem a Mamãe guardaria os restos de comida. Ela costuma dizer: 'Ah, se tivéssemos um ganso...' Agora ela pode ter um - e ela terá! Você vai trocar? Eu te darei minha ovelha pelo seu ganso, e meus agradecimentos também. "

O outro não tinha objeção, então eles trocaram e o fazendeiro pegou o ganso. Agora ele estava perto da cidade; a estrada estava ficando cada vez mais cheia, pessoas e gado passando por ele, aglomerando-se na estrada, na vala e até a plantação de batata do moleiro, onde sua galinha estava amarrada, para o caso de ficar assustada e se perder. Era uma galinha que piscava com um olho e parecia em boas condições.

"Cluck, cluck", disse ela; o que isso significava, eu não saberia; mas o que o camponês pensou quando a viu foi: "Ela é a galinha mais bonita que eu já vi - muito mais bonita do que qualquer das galinhas chocas de nosso pastor. Eu certamente gostaria de tê-la. Uma galinha sempre pode encontrar um grão de milho e ela quase pode se sustentar sozinha. Eu estou pensando que seria uma boa ideia levá-la em vez do ganso. Vamos trocar? ele perguntou.

"Trocar?" disse o outro. "Bem, não é uma má ideia!" E assim eles trocaram. O guarda do pedágio pegou o ganso e o fazendeiro pegou a galinha.

Ele fizera muitos negócios desde que saíra de casa para a cidade; estava quente e ele estava cansado. O que ele precisava era de uma bebida e algo para comer.

Ele havia chegado a uma estalagem e estava pronto para entrar, quando o ajudante do estalajadeiro o encontrou na porta, carregando um saco cheio de alguma coisa.

"O que você tem aí?" perguntou o fazendeiro.

"Maçãs podres", foi a resposta. "Um saco inteiro para os porcos."

"Que quantidade! Mamãe gostaria de ver tantos! Porque, no ano passado, tínhamos apenas uma única maçã na velha árvore perto do galpão de turfa. Essa maçã devia ser guardada, e ficava na cômoda até que se desmanchasse."Isso é sempre um sinal de prosperidade", Mãe disse. Aqui ela poderia ver bastante prosperidade! Sim, eu queria que ela pudesse ter esse saco todo de maçãs podres!

"Bem, o que você vai me dar por elas?" perguntou o ajudante do estalajadeiro.

"Dar por elas? Oras, eu vou te dar minha galinha!" Então ele passou-lhe a galinha, pegou as maçãs e foi para a estalagem, direto para o bar; Ele colocou o saco em pé apoiado no forno aquecedor, sem perceber que havia fogo nele. Havia um número de estranhos presentes, negociantes de cavalos, negociantes de gado e dois ingleses tão ricos que seus bolsos estavam cheios de moedas de ouro. Eles gostavam de fazer apostas, como os ingleses nas histórias sempre o fazem.

"Suss! Suss! Suss!" O que foi aquele barulho no fogão? Foram as maçãs que começaram a assar!

"O que é isso?" Todos disseram, e eles logo descobriram. Eles estavam ouvindo toda a história do cavalo que havia sido trocado primeiro por uma vaca e, finalmente, por um saco de maçãs podres.

"Bem, você vai ganhar uma boa surra da sua mulher quando voltar para casa!" disseram os ingleses. "Você vai se dar mal."

"Vou receber beijos, não pancadas", disse o fazendeiro. "Mãe dirá: 'O que o velho fizer, está certo'. "

"Vamos apostar nisso?" disseram os ingleses. "Temos ouro pela tampa! Cem libras esterlinas para cem libras de peso?"

"Vamos dizer um alqueire cheio", respondeu o camponês. "Só posso apostar meu alqueire de maçãs e a mim mesmo e a velha, mas acho que isso será mais do que uma medida completa."

"Aceitamos a aposta!" os ingleses exclamaram e a aposta foi feita! Então a carroça do estalajadeiro foi trazida para fora, os ingleses entraram nela, o fazendeiro entrou nela, as maçãs podres entraram nela e foram se embora para a cabana do velho.

"Boa tarde, Mãe."

"O mesmo para você, Pai."

"Bem, eu fiz a barganha."

"Sim, você sabe como fazer negócio", disse a esposa, e deu-lhe um grande abraço, esquecendo tanto o saco quanto os estranhos.

"Eu troquei o cavalo por uma vaca."

"Graças a Deus pelo leite!" disse a esposa. "Agora podemos ter leite, manteiga e queijo na nossa mesa! Que troca esplêndida!"

"Sim, mas eu troquei a vaca por uma ovelha."

"Isso é ainda melhor!" gritou a esposa. "Você é sempre tão atencioso. Temos bastante capim para uma ovelha. Agora nós vamos ter leite de ovelha, queijo de ovelha, e meias de lã, sim, e uma camisola de lã também. Uma vaca não poderia nos dar isso, ela perde todo o seu pelo, mas você é sempre um marido tão atencioso ".

"Mas então eu troquei a ovelha por um ganso."

"O quê? Será que realmente teremos ganso para a festa de São Miguel este ano, querido Pai? Você sempre pensa no que iria me agradar, e isso foi um pensamento lindo! Podemos amarrar o ganso, e vai ficar ainda mais gordo no dia de São Miguel. "

"Mas aí eu troquei o ganso por uma galinha", continuou o camponês.

"Uma galinha? Bem, isso foi um bom negócio!" respondeu sua esposa. "Uma galinha põe ovos e os choca e nós teremos galinhas. Imagine, um galinheiro! Exatamente a coisa que eu sempre mais quis!"

Sim, mas eu troquei a galinha por um saco de maçãs podres ".

"Então eu certamente devo te dar um beijo!" disse a esposa. "Obrigada, meu querido marido. E agora eu tenho algo para lhe dizer. Quando você saiu, decidi preparar um bom jantar para você - omelete com cebolinha. Agora eu tinha os ovos, mas sem cebolinha. Então eu fui até a escola, porque eu sei que eles têm cebolinha, mas aquela doce mulher é tão mesquinha que ela queria algo em troca O que eu poderia dar a ela? Nada cresce em nosso jardim, nem mesmo uma maçã podre; Eu não tinha nem isso para ela. Mas agora eu posso dar a ela dez maçãs ou mesmo um saco inteiro! Não é engraçado, Pai? ela disse e o beijou bem na boca.

"Eu gosto disso!" exclamaram os dois ingleses. "Sempre na pior, mas sempre feliz. Só isso já vale o dinheiro!" Então, eles ficaram muito contentes em pagar o alqueire de moedas de ouro para o camponês, que ganhou beijos em vez de pancadas por suas barganhas.

Sim, sempre compensa quando a esposa acredita e admite que seu marido é o homem mais sábio do mundo e que tudo o que ele faz está certo.

Bem, esta é a história. Eu ouvi quando era jovem, e agora você já ouviu, então você sabe que o que o velho faz está sempre certo."
Selo dinamarquês em homenagem a Andersen baseado nesse conto
Imagem: Fairy tales and stories (1900). Andersen, H. C. (Hans Christian), 1805-1875; Tegner, Hans, b. 1853, ill; Brækstad, H. L. (Hans Lien), 1845-1915 New York: The Century Co. Original em inglês na New York Public Library aqui.

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Conto: "Era um menino muito tristinho e um velho sem nome"

Essa estória eu escrevi há alguns anos para falar sobre os direitos da criança e do adolescente no Colégio Interativo, aqui em Caruaru. Sempre que a conto, fico muito emocionada. Devo contá-la novamente na conferência municipal do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente de Caruaru, como introdução para a história do Estatuto da Criança e do Adolescente 😊

Era menino muito tristinho e um velho que não tinha nome
Gabriela Kopinits - a Cigana Contadora de Estórias


Era um menino muito tristinho
Vivia sujo, muito magrinho
Não tinha casa, não tinha nada
Papai e mamãe não tinha não...

(Melodia de “Era uma casa muito engraçada”)

Era uma vez um menininho. Pobre, sujo, magrinho. Vivia numa casinha que ele mesmo inventou, com paredes feitas de tábuas e tijolos que encontrou por aí. Dormia no chão, em cima de uma pilha de jornais velhos. Não tinha travesseiro, nem coberta. Não tinha banheiro, nem cozinha. Não tinha nome, não tinha pai, nem tinha mãe. Não sabia nem quantos anos tinha. Nunca comemorava aniversário. Aliás, aquele menino nem sabia o que era festa. A vida dele era uma vida muito dura.
Todo dia ele levantava bem cedo, antes mesmo do sol sair ou do galo cantar. Mas não era para ir à escola, não. Aliás, ele nunca tinha ido à escola. Nem sabia como era. Ele acordava assim, bem cedinho, para ir trabalhar. Sabe onde esse menininho trabalhava? No lixão, separando coisas que as pessoas tinham jogado fora mas que ainda pudessem prestar. Coisas que pudessem ser recicladas ou, se tivesse sorte, uma roupinha, um sapato ou mesmo um brinquedo velho e quebrado que servisse para ele, que nunca tinha ganhado um presente sequer.
Lá no lixão a vida era muito difícil. Todos os dias um monte de crianças e adultos disputavam cada chegada de caminhão, remexendo no lixo, rasgando as bolsas de plástico, as caixas de papelão, procurando algo que desse algum dinheiro, qualquer trocadinho valia a pena. Além da disputa, no meio do fedor danado daquelas montanhas de lixo, o menininho ainda tinha que enfrentar os bichos que andavam por ali. Tinha urubu, rato e barata e teve até quem tivesse visto uma cobra. Mas o pior de tudo eram os bichos que a gente não via: os micróbios e bactérias que vinham junto com aquela sujeira toda.
Mas o menininho era corajoso. Seguia arrastando seu carrinho de mão, feito de caixote de feira, sempre em busca de algum tesouro: jornal, garrafa PET ou latinhas de alumínio, que era o que dava mais dinheiro.
Nesse dia ele teve sorte. Achou um monte de jornal e de revista, limpinhos. Pegou um monte, encheu seu carrinho e já ia se afastando quando encontrou um objeto que chamou a sua atenção. Era um livro! A capa toda colorida, mostrava um menino e sua família – deviam ser os seus pais – todos sorrindo contentes. O coração dele se encheu de um sentimento bom, que lhe aqueceu por dentro e fez esquecer até da fome que sentia.
Mas que pena que ele não sabia ler... Aquele livro devia contar a estória do menino da capa. Ele o abriu e folheou com cuidado para não rasgar, nem sujar o papel, ainda branquinho.  O livro era cheio de figuras mostrando o menino em várias situações: em casa, na rua brincando com os amiguinhos, na escola (pelo menos ele imaginava que aquilo era a escola).
Ele bem que gostaria de saber ler para poder ver como era a vida daquele outro menino, como era viver numa casa de verdade, de tijolo e alvenaria, com comida na mesa, com o carinho e a proteção de pai e mãe.
Ele nunca tinha conhecido nada daquilo e ansiava por saber como era viver outra vida. Um suspiro saiu de seu peito. Desde que se entendia por gente vivia sozinho. Não sabia como tinha nascido, nem onde. Sempre tinha pensado que era feito uma plantinha, que um dia brotou ali e ali mesmo cresceu.
O sol já estava forte e ele resolveu se apressar para levar seus achados para vender. Quem fazia esse meio de campo era o Velho, que tinha uma espécie de escritório perto do lixão. O menino foi empurrando o carrinho até lá. O Velho estava só.
- Bom dia! – cumprimentou respeitoso o menino. O Velho lhe inspirava um pouco de medo, sempre sério, de cara amarrada.
O homem ignorou o cumprimento:
- O que você tem aí?
- Jornais e revistas quase novos. – Respondeu o menino orgulhoso.
- Passe pra cá! – ordenou seco.
O menino obedeceu e descarregou o carrinho. O livro colorido, do menino feliz, ficou lá no fundo. O Velho notou.
- E esse aí?
O menino meneou a cabeça.
- Esse é meu.
O Velho soltou uma risada.
- E você sabe ler, moleque?
O menino levantou para ele os mansos olhos castanhos.
- Sei não, senhor!
- Então pra que quer um livro? – a pergunta foi num tom mais manso, mas cheio de curiosidade.
O menino pegou o livro e mostrou-lhe a capa.
- É que este livro deve contar uma estória muito boa, a estória desse menino aqui. Veja como ele está feliz, com a família dele.
Estendeu o livro para o Velho, que o pegou.
- Sim, ele parece mesmo muito feliz. Você gostaria de aprender a ler? – perguntou, surpreendendo o menino.
Os olhinhos se iluminaram.
- Oh, sim, eu queria muito, mais que tudo no mundo!
- Se é assim, vou lhe ensinar.
E daquele dia em diante a vida do menininho mudou bastante. Continuava acordando cedo, mas não era mais para ir ao lixão. Ia direto para o escritório do velho que passou a ensinar-lhe as letras e a cuidar dele. O menininho, que era corajoso, mostrou que também era muito dedicado. Aplicado, logo aprendeu todo o alfabeto, a juntar vogais e consoantes em sílabas, a construir suas primeiras palavrinhas. Um dia, o velho veio com um embrulho. Deu-o ao menino, que o abriu curioso. Era aquele livro que ele tinha encontrado no lixão e que o velho tinha guardado. Na capa, em cima da ilustração do menino sorridente com os pais, o menininho conteve a respiração. Devagar, soletrando as letras, uma por uma, e juntando as sílabas, conseguiu ler: “Direitos e deveres da criança”.
Emocionado, o velho pediu:
- Leia o nome do autor.
Estava escrito logo abaixo da ilustração. O menininho leu vagarosamente:
- Jota-O-A-O til – João – A-Ele-Vê-E-Esse – Alves. João Alves!
O velho fechou os olhos e o menininho viu que ele chorava calado.
- Por que o senhor está chorando? – ele perguntou.
O velho abriu os olhos, fixando-os na criança.
- É que todos temos um nome. O meu não é “Velho”.
- E qual é o seu nome? – perguntou o menininho.
- Eu havia me esquecido dele até que você entrou por aquela porta com esse livro. Leia de novo o nome do autor.
O menino obedeceu.
- João Alves.
- Pois é, esse é o meu nome. Fui eu quem escreveu esse livro. Há muito tempo atrás, em outra vida. Se quiser, posso lhe contar essa estória.
O menino aquiesceu.
- Sente-se aqui – disse o velho, mostrando um banquinho. - A estória é longa.
O menininho se sentou e esperou.
- Há muito tempo atrás...
Ele nunca soube se o outro, o menino da capa - era mesmo feliz ou não. A estória que ele ouviu naquele dia valia mais que mil livros juntos. Era a estória de um homem que tinha passado a vida ensinando crianças, mas que, um dia, por um capricho do destino, perdeu a fé e deixou a tristeza habitar em seu coração. Desistiu de tudo, perdeu tudo, inclusive seu nome. Até que um dia apareceu em sua porta um menino muito tristinho, que vivia sujo, muito magrinho, que não tinha casa, não tinha nada, apenas muito vontade de aprender a ler.
Caruaru, 09/10/2016

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Conto: São Francisco e a menina perdida - um milagre no Canindé

Esta estória me foi contado pelo meu pai há duas semanas. Sabedor que coleciono causos e contos do folclore nordestino, ele me narrou que há muito tempo, no Ceará, uma criança se perdeu na mata. Todos ajudaram a procurá-la mas ninguém a encontrou. Aflita, a mãe do pequeno fez uma promessa a São Francisco. 
Passado muito tempo, já tinham perdido a esperança de encontrá-la viva, eis que a criança aparece e, apesar de ter ficado tanto tempo perdida na mata, encontrava-se em perfeita saúde. Contou ela que durante todo o tempo em que esteve perdida, um bom velhinho lhe protegeu e alimentou.
A mãe então foi cumprir a promessa, levando a criança à igreja para agradecer a São Francisco. Quando se postaram diante da imagem, a criança exclamou:
- Foi ele, mamãe! Este foi o velhinho que cuidou de mim!
A imagem era ninguém menos de São Francisco.

Achei a estória linda e aproveito para reproduzir uma versão do site Cantinho Franciscano, com a imagem alusiva:
"Por volta do ano 1926, com apenas 4 anos de idade lá nas matas do Amazonas, perdeu-se Maria Aparecida. Seus pais aflitos procuraram todos os dias sem parar e não encontraram. Então a mãe cearense fez uma promessa a São Francisco, que iria imediatamente em romaria à cidade franciscana se sua filha chegasse salva em casa.
Um ano passou a mãe já quase sem esperança de encontrá-la de repente foi surpreendida com a chegada da filha em sua casa. A menina na escondeu nada da mãe contou que um velhinho de barbas dava-lhe comida e água todos os dias e lhe protegia de todos os perigos existente naquela mata.
Ele era muito amável e lhe ensinou a rezar, ela chamava-o de padrinho, a mãe ouviu tudo e não poupou esforços para pagar a promessa.
Veio para Canindé conduzindo a criança, ao entrarem no santuário a menina avistou a imagem de são Francisco no alar e disse: mãe lá está o velhinho que me salvou."

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Conto: A fonte das três comadres

Esta versão é de Theobaldo Miranda Santos, mas há uma que adoro, adaptação que Monteiro Lobato fez do conto recolhido pelo mestre Silvio Romero.
A fonte das três comadres
Era uma vez um rei muito poderoso que teve uma enfermidade nos olhos e ficou completamente cego. Consultou então os melhores médicos do mundo, tomou todos os remédios aconselhados pela ciência, mas nada conseguiu. Sua cegueira parecia incurável. Um belo dia, apareceu no palácio uma velhinha pedindo esmola e, sabendo que o rei estava cego, pediu licença para dirigir-lhe a palavra, pois desejava ensinar-lhe um remédio maravilhoso. Conduzida à presença do rei, ela lhe disse: 
— Saiba Vossa Majestade que só existe uma coisa capaz de fazer voltar sua vista: é banhar seus olhos com água tirada da Fonte das Três Comadres. É muito difícil, porém, ir a essa fonte que fica num reino situado quase no fim do mundo. Quem for buscar a água deve entender-se com uma velha que mora perto da fonte. Ela conhece o dragão que guarda a fonte e sabe quando ele está acordado ou adormecido. 
O rei ficou muito satisfeito com a informação da velhinha e recompensou-a com uma bolsa cheia de dinheiro.
Mandou, em seguida, preparar uma esquadra para conduzir seu filho mais velho que deveria ir buscar a água da fonte milagrosa. Deu-lhe o prazo de um ano para cumprir sua missão, aconselhando-o a não saltar em nenhum porto para não se distrair do que devia fazer. O príncipe partiu, mas no meio da viagem, encontrou uma cidade onde havia muitas festas e lindas moças. Atraído pelos divertimentos, aí ficou gastando todo o dinheiro que levava e contraindo grandes dívidas. No fim do prazo que lhe fora marcado, não seguiu viagem nem voltou ao reino do seu pai, o que causou a este profundo desgosto.
Resolveu então o rei preparar outra esquadra a fim de que o seu segundo filho fosse buscar a água maravilhosa. O moço partiu, mas encontrou em seu caminho a mesma cidade onde se havia arruinado o seu irmão mais velho. Ficou também encantado pelas festas e pelas moças bonitas, e gastou tudo o que trazia, esquecendo-se da missão que seu pai lhe confiara. No fim de um ano, ainda se encontrava nessa cidade, pobre e endividado.
O rei, ao saber da notícia do que acontecera ao seu segundo filho, ficou muito triste e desanimado. E perdeu a esperança de curar sua cegueira. Mas seu filho mais moço, que era ainda um menino, não se conformou com os acontecimentos e disse-lhe: 
— Agora, meu pai, eu é que vou buscar a água. Garanto-lhe que hei de trazê-la! 
O rei procurou dissuadi-lo:
— Se seus irmãos, que eram homens nada conseguiram, que poderá você fazer, meu filho? 
Mas, o pequeno príncipe tanto insistiu e rogou que o pai acabou cedendo. E mandou preparar uma esquadra para sua viagem. O jovem partiu cheio de esperança. Depois de muito navegar, encontrou a famosa cidade onde seus irmãos já se achavam presos pelas dívidas que haviam contraído. O príncipe pagou as dívidas dos irmãos e conseguiu pô-los em liberdade. Estes tudo fizeram para dissuadir o rapaz de seguir viagem.
Mas o príncipe nada quis ouvir e continuou, resolutamente sua jornada.
Chegando à região onde se encontrava a Fonte das Três Comadres, desembarcou sozinho, levando apenas uma garrafa. Seguiu logo para a casa da velhinha, que residia perto da fonte. Esta, ao vê-lo, ficou muito admirada, dizendo: 
— Por que veio aqui, meu netinho? Está correndo um grande perigo! O monstro que vigia a fonte é uma princesa encantada que tudo devora. Se quiser, realmente, apanhar água da fonte, aproveite a ocasião em que o monstro estiver adormecido. Quando ele estiver com os olhos abertos, pode aproximar-se sem receio. É sinal de que está dormindo. Mas se o encontrar com os olhos fechados, fuja depressa, pois ele estará, na certa, acordado.
O príncipe prestou bastante atenção aos conselhos da velha e seguiu para a fonte. Quando lá chegou, viu que a fera estava com os olhos abertos. Verificando que ela estava dormindo, o príncipe aproveitou o momento para encher sua garrafa com a água milagrosa. Mas, quando se ia retirando cuidadosamente, o monstro acordou e lançou-se, com fúria, sobre o rapaz. Este puxou da espada e travou uma luta terrível com a fera. Depois de muito lutar, conseguiu ferir o horrendo bicho e fazer seu sangue correr. Nesse momento, o monstro se desencantou, transformando-se numa belíssima princesa. O príncipe ficou extasiado, pois nunca tinha visto uma moça tão formosa. Ela então lhe disse: 
— Prometi que havia de me casar com aquele que me desencantasse. Portanto, dentro de um ano, virás buscar-me. Se não o fizeres, irei à tua procura. 
E para que o jovem pudesse ser reconhecido quando fosse buscá-la, a princesa deu-lhe um pedaço do seu vestido.
Contente e feliz, o príncipe partiu de volta à sua terra. Passando pela cidade onde se encontravam seus irmãos, convidou-os para embarcar na sua esquadra, a fim de que pudessem regressar ao seu país. Os irmãos aceitaram o convite. O rapaz havia guardado a garrafa com a água milagrosa na sua mala. Seus irmãos armaram, então, um plano para roubar-lhe a garrafa e se apresentarem ao pai como seus salvadores. Para isso sugeriram, ao príncipe, dar um banquete na esquadra para comemorar o fato de ter ele conseguido o maravilhoso remédio. A festa foi realizada e os irmãos, aproveitando-se da boa fé do jovem príncipe, conseguiram que ele bebesse muito vinho e adormecesse profundamente. Tiraram então do seu bolso a chave da mala, abriram-na, tiraram a garrafa com o remédio e a substituíram por outra cheia de água do mar.
Quando a esquadra atracou no porto de sua terra, o príncipe foi recebido com grande alegria e muitas festas. Mas, quando ele colocou nos olhos do pai a água que supunha ser da fonte maravilhosa, o velho soltou um grito de dor, devido ao sal do mar, e continuou cego. Os dois irmãos traidores acusaram então o príncipe de impostor e declararam que eles é que haviam conseguido a água milagrosa. Dizendo isso, banharam com a mesma os olhos do rei que recobrou a visão. Houve então grandes festas e banquetes no palácio e o jovem príncipe foi condenado à morte. Mas os soldados encarregados de degolar o príncipe, ficaram com pena do rapaz e o deixaram na floresta. O príncipe ficou tão desgostoso que perdeu o amor à vida. Um lenhador malvado o encontrou, caminhando como um louco, no meio da mata. Vendo que ele não reagia, fez dele seu escravo, obrigando-o a trabalhar, sem descanso.
Um ano depois, chegou a ocasião em que o rapaz devia ir casar com a princesa, conforme havia combinado na Fonte das Três Comadres. Não tendo ele aparecido, a princesa ficou preocupada. Mandou então aparelhar uma poderosa esquadra e partiu para o reino do príncipe. Chegando lá, deu ordem ao comandante da esquadra para avisar ao rei de que ele devia enviar-lhe o filho que fora ao seu reino buscar um remédio e lhe prometera casamento. Caso o noivo não viesse ao seu encontro, ela ordenaria à esquadra para fazer fogo sobre a cidade. O rei ficou apavorado e mandou seu filho mais velho apresentar-se à princesa, supondo que ele fosse o noivo. Mas a princesa, ao vê-lo disse: 
— Grande mentiroso, onde está o sinal do nosso reconhecimento? 
Ele que nada possuía, ficou calado e voltou para a terra envergonhado.
Nova intimação e foi ter com a princesa o segundo filho do rei. Repetiu-se a pergunta anterior e o príncipe nada respondeu. A princesa mandou então que os canhões da sua esquadra fossem preparados para o bombardeio da cidade O rei ficou aflitíssimo, certo de que a capital do seu reino seria arrasada, pois havia mandado matar o filho mais moço. Nesse momento, surgiram os dois soldados encarregados de executar o jovem príncipe, que confessaram ao rei que não o tinham degolado. Saiu todo o mundo à procura do príncipe e foi prometido um grande prêmio a quem o encontrasse.
O lenhador que o tinha escravizado ficou mais morto do que vivo quando soube que ele era filho do rei. Mais do que depressa, colocou o rapaz nas costas e o levou ao palácio. O príncipe foi então lavado e vestido com lindas roupas. O prazo que a princesa tinha concedido já estava terminado e, quando os canhões iam começar a bombardear a cidade, o rapaz correu ao encontro da noiva, sendo logo reconhecido devido ao pedaço do vestido que levava na mão. A princesa abraçou-o chorando de alegria. Seguiram então para o reino da princesa onde se casaram no meio de festas que duraram seis meses. O rapaz tornou-se rei de um dos países mais belos e ricos do mundo. Seus irmãos traidores foram expulsos do reino de seu pai e condenados a pedir esmola até o fim de sua vida.
Fonte: Contos Maravilhosos – Theobaldo Miranda Santos, Editora Nacional (1966)
Imagem: Mundo da Luha

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Conto: Toalha de mesa

Os caminhos de Deus são misteriosos...

“Um novo pastor, recentemente formado, e sua esposa, que foram encarregados de reabrir uma igreja no bairro de Brooklyn, NY, chegaram no início de outubro, entusiasmados com a oportunidade.
Quando viram a igreja, observaram que havia muitos estragos e um grande trabalho a ser feito. Sem se deixar abater, estabeleceram como meta deixar tudo pronto para o primeiro serviço: o culto de Natal.
Trabalharam sem descanso, consertando o telhado... refazendo o piso... pintando... e, muito antes do Natal, em 18 de dezembro, tudo estava pronto!
Mas...  No dia seguinte, 19 de dezembro, desabou uma terrível tempestade que se alongou por dois dias.
No dia 21, o pastor foi até a igreja.  Seu coração doeu... viu que o telhado tinha quebrado e que uma grande área do revestimento de gesso decorado, da parede do santuário, logo atrás do púlpito, havia caído.
O pastor, enquanto limpava o chão, pensava em como resolver a situação.
No caminho de casa, pensando adiar o culto de Natal, observava as vitrines, enfeitadas para a época, quando notou um bazar beneficente e parou por instantes. Uma linda toalha de mesa, de crochê, na cor marfim, com um crucifixo delicadamente bordado no centro chamou-lhe a atenção.  Era do tamanho exato para cobrir o estrago atrás do púlpito. Comprou-a e voltou para a igreja.
Começou a nevar. Apressou seus passos e quando chegava à porta da igreja uma velha senhora vinha correndo em direção contrária tentando pegar o ônibus, o que não conseguiu.
O pastor convidou-a a entrar para esperar pelo próximo, abrigando-se do frio, que viria 45 minutos depois. Ela sentou-se num banco e nem prestava atenção no pastor que já providenciava a instalação da toalha de mesa na parede.
Ao terminar afastou-se e pôde admirar o quanto a toalha era linda e servia perfeitamente para esconder o estrago. Então, o pastor notou a velha encaminhando-se para ele. Seu rosto estava lívido e perguntou:
- Pastor, onde o senhor encontrou esta toalha de mesa?
O pastor contou a história. A mulher pediu-lhe que examinasse o canto direito inferior para encontrar as iniciais EBG bordadas. O pastor fez o que a mulher pediu e, intrigado, confirmou.
A mulher disse:
- Estas são as minhas iniciais.
E contou que fez esta toalha de mesa há 35 anos atrás, na Áustria. Contou que, antes da guerra, ela e seu marido eram bem de vida. Quando os nazistas invadiram seu país combinaram fugir; ela iria antes e seu marido a seguiria uma semana depois. Ela foi capturada, trancada numa prisão e nunca mais viu seu marido e sua casa.
O pastor ofereceu a toalha, mas, ela recusou, dizendo que estava num lugar muito apropriado. 
Insistindo, ofereceu-se para levá-la até sua casa; era o mínimo que poderia fazer. Ela morava em Staten Island e tinha passado o dia em Brooklin para um serviço de faxina.
No dia de Natal a igreja estava quase cheia. Foi um lindo trabalho.
Ao final, o pastor e sua esposa cumprimentaram os fiéis um a um à porta e muitos diziam que retornariam. Um velho homem, que o pastor reconheceu pela vizinhança, permaneceu sentado, atônito.  O pastor aproximou-se e, antes que dissesse palavra, o velho perguntou:
- Onde o senhor conseguiu a toalha de mesa da parede? Ela é idêntica à uma que minha mulher fez, muitos anos atrás, quando vivíamos na Áustria, antes da guerra. Como poderiam existir duas toalhas tão parecidas?
Imediatamente, o pastor entendeu o que tinha acontecido e disse:
- Venha... eu vou levá-lo a um lugar que o senhor vai gostar muito.
No caminho, o velho contou a mesma história da mulher. Ele, antes de poder fugir, também havia sido preso e nunca mais pôde ver sua mulher e sua casa, por 35 anos.
Ao chegar à mesma casa onde deixara a mulher, 3 dias antes, ajudou o velho a subir os 3 lances de escada e bateu na porta.
Creio que não há necessidade de se contar o resto da história. Quem disse que Deus não trabalha de maneira misteriosa?”

Fonte: Nova Era

terça-feira, 31 de julho de 2018

Conto: O leão e o homem



O leão e o homem
Folclore nordestino

O leão é o rei das fera. É o rei... é o que quer ser mais valente no mundo, é o leão. Encontrou-se com a onça e trataram uma palestra, dizendo:
- Camarada onça, eu sou o rei das fera! Sou o mais valente que pode existir.
Aí, a onça disse:
- Você tá muito enganado! O mais valente que existe é o bicho-homem!
Disse:
- Como é que ... eu tinha vontade de me topar com o bicho-homem. Como é que eu topo com o bicho-homem, pra experimentar se ele é valente?
Aí, a onça disse:
- Vai haver uma festa de casamento ... você vá pastorar lá na estrada que você encontra o bicho-homem.
Aí, o leão, foi, se escondeu no beco do caminho ... quando lá vinha uma veinha, muito carcunda. Quando a veinha ia passando, o leão saltou na frente:
- A senhora é o bicho-homem?
Disse:
- Não senhor. Sou a mãe do bicho-homem.
Disse:
- Então, só pode ser outro.
Quando deu fé lá vinha um veinho. Aí, ele saltou na frente:
- Você é o bicho-homem?
Disse:
- Não senhor. Eu já fui.
- Passe, vá embora.
Lá vinha um menino assobiando. Um menino muito esperto, contente! Aí, quando viu o menino, saltou na frente:
- Meu filho, você é o bicho-homem?
- Não senhor. É de ser ainda o bicho-homem.
Aí, ficou. Quando deu fé, lá vinha o homem: um caboclo com chapéu de couro, um bacamarte ... que vinha voando pedra pra todo canto. Quando foi empariando, foi dizendo:
- O senhor é o bicho-homem?
- Pronto, leão, sou o bicho-homem. Que é que o senhor deseja?
- Desejo lutar. Pra ver se você é o rei das fera e eu sou o rei das fera ... das montanhas, pra ver se nós entramos em luta.
Aí, o homem disse ao leão:
- Demore aí... Deixe eu dar um espirro primeiro, pra mode nós entrar em luta.
Aí, o leão disse:
- Pronto, pode dar o seu espirro.
Pense num "espirro"...
O homem disparou o bacamarte, quebrou o focinho do leão, a cara com tudo. O leão saiu na carreira. Adiante, encontrou a onça, disse:
- Camarada onça, eu não quero negócio com o bicho-homem! O bicho é a fera pior que existe no mundo! O espirro do bicho fez esse trabalho comigo ... e o bicho-homem. Como é que faz? Não quero negócio com o bicho-homem.
Aí, ficou sendo o homem a fera maior do Brasil.

Fonte: Severino Carreiro. Catolé do Rocha. 17.07.1980. Relato recolhido por Myrian Gurgel Maia. In: TRIGUEIRO, O.M. e PIMENTEL, A. A. Contos populares brasileiros - Paraíba. Recife: FUNDAJ, Massangana, 1996, p.54-5.

Imagem: "Bacamarteiro", por Feliciano dos Prazeres

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