Há não muito tempo atrás a
criança ainda era vista simplesmente como “um adulto em miniatura”, conceito
medievalista ainda prevalente. Não se pensava a criança como um ser tenro, que
necessitasse de cuidados especiais, de educação cuidadosamente elaborada para
ela. O fato de uma criança nascer significava apenas um par de braços a mais
para ajudar na lida e uma boca a mais para sustentar nas classes mais baixas ou
um peão valioso no jogo dos casamentos e dotes arranjados por interesse
político ou financeiro.
Até o que hoje conhecemos como
estórias para crianças, muitas não foram absolutamente pensadas ou mesmo compostas
para elas, entre estas clássicos como Chapeuzinho
Vermelho e A bela adormecida (que
no original se chamava A bela adormecida
no bosque). Eram contos, em sua maioria com conselhos de bom comportamento
embutidos, elaborados para as senhoras damas. Vejam o que aconteceu com a mocinha que não seguiu o conselho da mamãe!
– dizia a história. Foi devorada por um
lobo! – Arrematava o contador de estória, secundado por gritinhos de pavor
das encantadoras mademoiselles.
Charles Perrault (1628-1703),
contemporâneo e servidor de Luís XIV, foi quem primeiro teve a ideia de reunir esses
relatos ouvidos nos salões da corte francesa no que seria o primeiro livro infantil.
Publicado em janeiro de 1697 – Perrault já com 69 anos – o livro recebeu o nome
de Histórias ou contos do tempo passado
com moralidades com o subtítulo
Contos da Mamãe Gansa (Histoires ou Contes du temps passé – Contes
de ma mère l’Oye) e trazia
os conhecidos A bela adormecida ao bosque
(La Belle au bois dormant), Chapeuzinho Vermelho, O Barba Azul, O Gato de Botas, As fadas,
Cinderela e Riquete de Crista.
A ideia do “adulto em miniatura”
começou a mudar depois daí, graças também ao Renascimento, importante movimento
cultural que marcou a transição entre o medievalismo e a nova cultura burguesa
e afastou um bocado a Igreja da influência social. Os ares renovadores do
Renascimento – depois a Revolução Francesa - abriram brechas no pensar
ocidental que iriam trazer gratas consequências na vida cotidiana, entre elas a
da educação menos rígida e opressora, especialmente nas classes mais ricas. No
entanto, a criança só começou mesmo a ser vista como um ser especial,
diferenciado, em meados do século XVIII, depois da Revolução Francesa e com o
advento do Romantismo.
A educação infantil, propriamente dita,
surgiu com o pedagogo alemão Friedrich Froebel que, de forma pioneira, em junho
de 1840, fundou
os Kindergarden (jardins de
infância), associando a importância dos cuidados com a educação da criança,
desde os seus mais tenros anos, para o seu correto e sadio desenvolvimento à
imagem da plantinha sendo cuidada desde cedo por um atento jardineiro.
No Brasil, os livros ainda eram
publicados pela Imprensa Régia, estrutura burocrática e de controle editorial trazida
por D. João VI em 1808. Traduções de Perrault e dos folcloristas alemães Jacob
e Wilhelm Grimm era o que havia. Foi só em 1894 que o jornalista carioca
Alberto Figueiredo Pimentel (1869-1914) publicou o primeiro livro infantil do
país: Contos da Carochinha, coletânea
com 61 contos populares, “morais e proveitosos, de vários países, traduzidos e
recolhidos diretamente da tradição oral”, como está dito na contracapa.
Mas o primeiro livro escrito de
fato para as crianças aqui no Brasil, retratando a nossa cultura, as nossas
tradições e valores, foi mesmo A menina
do narizinho arrebitado, publicado por José (Renato) Bento Monteiro Lobato em
1920, dando origem a uma série de livros de amplo sucesso com os personagens do
Sítio do Picapau Amarelo.
Narizinho, Pedrinho, Emília a
boneca falante, o Visconde de Sabugosa, Dona Benta, Tia Nastácia e seus
deliciosos bolinhos de chuva, o Saci e a Cuca, dentre outros queridos
personagens saídos da genial imaginação de Monteiro Lobato, vêm acompanhando
gerações de crianças desde então, rendendo ao escritor o justo reconhecimento
de Patrono da Literatura Infantil Brasileira. Mas o reconhecimento maior mesmo
veio através da Lei nº 10.402, assinada pelo então presidente Fernando Henrique
Cardoso, em 8 de janeiro de 2002, instituindo o Dia Nacional do Livro
Infantil, a ser comemorado anualmente no dia 18 de abril, data do nascimento do
grande Monteiro Lobato.
“Um país se faz com homens e
livros”, disse o mestre. Viva, pois, o Dia Nacional do Livro Infantil!
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