terça-feira, 25 de junho de 2019

Conto: "O ladrão de damascos"

Ainda maravilhada com o folclore armênio, trago outro belo conto - este, sobre um vizinho invejoso que teve um merecido castigo. Esta versão eu li no site de Pepe Marin Gil e traduzi do espanhol para você. A ilustração é de Catharine Chardonnay para o livro de Reine Cioulachtjian, "Cuentos y leyendas de los armenios", onde li outra bela versão desse conto.

"Nos arredores de uma cidade vivia uma pobre viúva que tinha apenas um filho. Ela o educou em respeito aos anciãos e aos costumes de seu povo. Mãe e filho viviam do que o pequeno jardim produzia, que cultivavam com as próprias mãos e com muito amor.

No meio daquele jardim havia uma linda árvore de damasco muito velha. Seus frutos tinham um sabor requintado, com aromas de sol e mel. Sua polpa macia se desmanchava ao contato com os dentes, liberando um delicado e perfumado suco que enchia a boca com a sua doçura. Mãe e filho vendiam esses damascos, chamados "os seios de Semiramis", a pessoas ricas que pagavam um bom dinheiro por eles.

Um vizinho, invejoso, propusera várias vezes à viúva, comprar-lhe o jardim, mas ela sempre recusara. Irritado, o homem propôs forçá-la a vendê-lo. Todas as noites pulava o muro que os separava, subia na árvore e pegava uma grande quantidade de damascos, de modo que no dia seguinte a mãe não conseguia colher os frutos necessários para vendê-los e cumprir os pedidos de seus clientes ricos. Então, pouco a pouco, eles perderam o interesse ​​e acabaram comprando de outro vendedor, o vizinho invejoso.

Com o passar do tempo, a situação econômica da família piorou. Então a mãe foi implorar a seu vizinho malvado que não pegasse seus damascos, porque a venda deles lhes dava comida. A única resposta que dele recebeu foi:

   -Bem, se o que você precisa é de dinheiro, aceite minha oferta e me venda o jardim.

Às vezes, o filho sentia uma terrível tentação de insultar e bater no seu vizinho, mas felizmente seu bom senso o ajudava a cair em si e se conter:

"Bem, eu não quero machucar ninguém por um punhado de damascos", ele disse a si mesmo. "É verdade que eu e minha mãe vivemos graças a eles, mas, enfim, vou procurar trabalho para ganhar dinheiro. Amanhã irei à cidade para oferecer meus serviços como porteiro".

Naquela mesma noite, depois que mãe e filho comeram do pouco que ainda tinham e quando estavam prontos para ir para a cama, ouviram uma batida na porta. O filho foi abri-la e encontrou-se diante de um jovem de aparência majestosa.

"Eu sou um viajante que se perdeu", disse o estranho. Estou com fome e com frio. Você pode me dar hospitalidade para esta noite? Eu vou embora amanhã de manhã cedo.

O filho recebeu o misterioso estranho com todas as honras. A mãe, obedecendo às leis sagradas da hospitalidade, ofereceu-lhe o melhor que tinha e abriu para ele sua última garrafa de vinho, o único vestígio de um passado mais próspero e feliz.

O homem comeu com apetite e depois disse a seus anfitriões que ele gostaria de comer alguma fruta.

Ah! -O filho respondeu-, não podemos satisfazer seu desejo. Um vizinho perverso e invejoso rouba os doces damascos do nosso jardim. E ele contou ao visitante sobre o roubo diário de damascos por seu vizinho. E acrescentou:

- Saiba, bom senhor, que não me falta vontade de nos livrar desse mal. Eu bem que gostaria de surpreendê-lo roubando e aí acabar com ele. Mas quando eu reflito e percebo que a vida é um bem sagrado, afasto esses pensamentos. Eu não quero machucá-lo por uma simples cesta de damascos.

- Seus sentimentos te honram e te fazem bem, disse o estranho. - Mas vou lhe dizer uma coisa, vou punir aquele ladrão sem que tenha que pagar com a própria vida.

Ele pediu que o levassem até a árvore de damasco centenária, a tocou com a mão e garantiu ao rapaz que aquele que subir na árvore sem autorização ficaria preso por seus galhos e não poderia descer de jeito nenhum.

Na noite seguinte, como sempre, o ladrão subiu no pé de damasco e começou a colher os frutos mais belos e maduros que lá havia. Mas quando ele quis descer, todos os seus esforços foram inúteis. Os galhos o mantinham preso na árvore.

Na manhã seguinte, mãe e filho ouviram barulhos altos no pomar e correram em direção a ele. Muitos vizinhos vieram e observaram o vizinho malvado que estava preso entre os galhos da árvore de damasco. Quanto mais ele se mexia, mais preso ficava. Enquanto isso, todos riam e zombavam dele. Finalmente, eles mandaram chamar o juiz. Antes de ser libertado da árvore, o vizinho ladrão reconheceu publicamente seu malfeito e, perante o juiz, se ofereceu para pagar todos os damascos roubados.

Mãe e filho ouviram suas súplicas e permitiram que ele finalmente descesse da árvore."

sábado, 22 de junho de 2019

Conto: "Semíramis e Ara, o Belo"

Este belo conto veio da obra "Cuentos y leyendas de los armenios", da franco-armênia Reine Cioulachtjian com ilustrações da francesa Catherine Chardonnay, cuja versão em espanhol que encontrei na Biblioteca Central de Cerdanyola del Vallès (Barcelona). Fala do amor da mítica rainha Semíramis, da Babilônia, pelo belo rei Ara, rei da Armênia. Vamos a ele, na versão de Reine e minha livre tradução:

"As hortas de Van eram as mais bonitas do mundo. Até o início do século XX produziu frutos de sabor delicado não encontrado em qualquer outro lugar: pêssegos macios como veludo, cerejas tenras da cor do rubi, uvas pretas com sumo de mel, damascos dourados e grandes como romãs, com aromas de rosa, sol e de almíscar...
Se os frutos de Van eram tão bonitos, foi graças ao cuidado constante que os armênios lhes dedicaram por milênios. Mas isso também era devido ao milagre do amor.

Na verdade, era uma vez uma rainha bela como uma lua de catorze dias: grandes olhos negros sob sobrancelhas arqueadas finamente desenhadas, lábios vermelhos, corpo de gazela... Chamava-se Semíramis e era rainha da Babilônia. Na Armênia governava o rei Ara, o Belo. Semíramis estava apaixonada por Ara, mas Ara era casado e rejeitava suas investidas. O amor da rainha por Ara era tão grande que, incapaz de resignar-se a sua indiferença, decidiu que faria o que fosse para conseguir por amor, mesmo contra a sua vontade. E ela conseguiu que, naquele jardim, todos falassem dela.

E em uma noite de lua cheia, Semíramis, vestida como uma deusa, tão bonita que, ao seu lado, o sol parecia escurecer, entrou nos jardins do rei e, sob a luz leitosa da estrela da noite, sorveu, uma a uma, as essências de todas as árvores, dando-lhes às cerejas o sabor dos seus lábios, ao pêssego o veludo de sua pele e o formato dos seus seios, às uvas pretas o fulgor dos seus olhos e às maçãs o rubro de suas faces...
É por isso que as frutas da região de Van são tão bonitas, aveludadas e doces. Mesmo depois de tantos milênios, elas continuam a nutrir-se da beleza que Semíramis lhes deu por amor.
Quanto à bela história de amor, digamos que não teve um bom final. Ara, sempre fiel a sua esposa, não foi seduzido pelos encantamentos de Semíramis. Ela, rancorosa, declarou-lhe guerra, mas ordenou que seus capitães e seus soldados não matassem Ara, a quem eles facilmente reconheceriam por sua armadura com o emblema real. No entanto, Ara trocou sua vestimenta com a de seu escudeiro e morreu.
Semíramis, desesperada, ordenou que buscassem o seu corpo entre os mortos no campo de batalha, e o colocou no alto das muralhas da fortificação. Ali, orou aos deuses Haralez (dois deuses cães, que segundo a tradição curam as feridas lambendo-as e impregnando-as com sua saliva) para que eles pudessem trazê-lo de volta à vida. 
A história, no entanto, não nos diz se os deuses cumpriram sua missão sagrada..."

Que linda estória, hein? E para finalizar, digo o que aqui aprendi em castellano:
"Y colorín colorado, este cuento se ha acabado!" 
e em catalão:
"Conte contat, conte acabat!"

Fonte: Cuentos y leyendas de los armenios: Un pueblo del Caúcaso, de Reine Cioulachtjian com ilustrações de Catherine Chardonnay (Madrid: Ed. Kókinos, 2007).

Conto: "O semeador de tâmaras"

Esta versão vem do livro El saber es más que la riqueza, de  Silvia Dubovoy O semeador de tâmaras Em um oásis perdido no deserto, o velho El...