quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Conto: "Os dois reis de Gondar"

Esse bonito conto veio lá da Etiópia e essa versão foi escrita pela espanhola Anna Soler-Pont, no livro "O príncipe medroso e outros contos africanos", da Cia das Letras. Eu também ouvi uma deliciosa versão na voz de Zezé Motta no episódio 10 do documentário "Sankofa - a África que te habita", disponível na Netflix, que vou disponibilizar no meu podcast "Estórias da Cigana".

Cena de "Sankofa - a África que te habita"

Os dois reis do Gondar

Era um dia como os de outrora... e um pobre camponês, tão pobre que tinha apenas a pele sobre os ossos e três galinhas que ciscavam alguns grãos de teff que encontravam pela terra poeirenta, estava sentado na entrada da sua velha cabana como todo fim de tarde. 

De repente, viu chegar um caçador montado a cavalo. O caçador se aproximou, desmontou, cumprimentou-o e disse: 

— Eu me perdi pela montanha e estou procurando o caminho que leva à cidade de Gondar. 

— Gondar? Fica a dois dias daqui — respondeu o camponês. — O sol já está se pondo e seria mais sensato se você passasse a noite aqui e partisse de manhã cedo. 

O camponês pegou uma das suas três galinhas, matou-a, cozinhou-a no fogão a lenha e preparou um bom jantar, que ofereceu ao caçador. Depois de comerem os dois juntos sem falar muito, o camponês ofereceu sua cama ao caçador e foi dormir no chão ao lado do fogo.

No dia seguinte bem cedo, quando o caçador acordou, o camponês explicou-lhe como teria que fazer para chegar a Gondar: 

— Você tem que se enfiar no bosque até encontrar um rio, e deve atravessá-lo com seu cavalo com muito cuidado para não passar pela parte mais funda. Depois tem que seguir por um caminho à beira de um precipício até chegar a uma estrada mais larga... 

O caçador, que ouvia com atenção, disse: 

— Acho que vou me perder de novo. Não conheço esta região... Você me acompanharia até Gondar? Poderia montar no cavalo, na minha garupa. 

— Está certo — disse o camponês —, mas com uma condição. Quando a gente chegar, gostaria de conhecer o rei, eu nunca o vi. 

— Você irá vê-lo, prometo. 

O camponês fechou a porta da sua cabana, montou na garupa do caçador e começaram o trajeto. Passaram horas e horas atravessando montanhas e bosques, e mais uma noite inteira. Quando iam por caminhos sem sombra, o camponês abria seu grande guarda-chuva preto, e os dois se protegiam do sol. E quando por fim viram a cidade de Gondar no horizonte, o camponês perguntou ao caçador: 

— E como é que se reconhece um rei? 

— Não se preocupe, é muito fácil: quando todo mundo faz a mesma coisa, o rei é aquele que faz outra, diferente. Observe bem as pessoas à sua volta e você o reconhecerá. 

Pouco depois, os dois homens chegaram à cidade e o caçador tomou o caminho do palácio. Havia um monte de gente diante da porta, falando e contando histórias, até que, ao verem os dois homens a cavalo, se afastaram da porta e se ajoelharam à sua passagem. O camponês não entendia nada. Todos estavam ajoelhados, exceto ele e o caçador, que iam a cavalo. 

— Onde será que está o rei? — perguntou o camponês. — Não o estou vendo! 

— Agora vamos entrar no palácio e você o verá, garanto! 

E os dois homens entraram a cavalo dentro do palácio. O camponês estava inquieto. De longe via uma fila de 21 pessoas e de guardas também a cavalo que os esperavam na entrada. Quando passaram na frente deles, os guardas desmontaram e somente os dois continuaram em cima do cavalo. O camponês começou a ficar nervoso: 

— Você me falou que quando todo mundo faz a mesma coisa... Mas onde está o rei? 

— Paciência! Você já vai reconhecê-lo! É só lembrar que, quando todos fazem a mesma coisa, o rei faz outra. 

Os dois homens desmontaram do cavalo e entraram numa sala imensa do palácio. Todos os nobres, os cortesãos e os conselheiros reais tiraram o chapéu ao vê-los. Todos estavam sem chapéu, exceto o caçador e o camponês, que tampouco entendia para que servia andar de chapéu dentro de um palácio. O camponês chegou perto do caçador e murmurou: 

— Não o estou vendo! 

— Não seja impaciente, você vai acabar reconhecendo-o! Venha sentar comigo. 

E os dois homens se instalaram num grande sofá muito confortável. Todo mundo ficou em pé à sua volta. O camponês estava cada vez mais inquieto. Observou bem tudo o que via, aproximou-se do caçador e perguntou: 

— Quem é o rei? Você ou eu? 

O caçador começou a rir e disse: 

— Eu sou o rei, mas você também é um rei, porque sabe acolher um estrangeiro! 

E o caçador e o camponês ficaram amigos por muitos e muitos anos.

terça-feira, 18 de abril de 2023

Olha a Cigana na CBN!

 

A Cigana e o seu livro - Foto: Victor Vargas/Guanabara-Kirimurê

Opa! Em comemoração ao Dia Nacional do Livro Infantil - data de nascimento do maravilhoso Monteiro Lobato - vou estar na Rádio CBN Caruaru, nesta terça-feira 18 de abril às 14h30, participando do programa Panorama CBN, com Almir Vilanova e Moisés Rouche, meus eternos e queridos Mimi & Momô dos saudosos tempos das ondas do rádio FM.

Vou falar sobre os pioneiros do livro infantil (inclusive uma surpresa para muita gente que não sabe que entre eles, há importantes 'elas'), algumas estratégias para despertar o interesse da turminha pela leitura, a polêmica do "cancelamento" do grande Lobato por acusações de racismo, um pouco do meu trabalho como escritora e contadora de estórias e, claro, o podcast "Estórias da Cigana", onde narro um mundo de contos de tudo quanto é canto do mundo.
Não perca, sintonize nos 89,9FM ou acompanhe ao vivo pelo https://www.cbncaruaru.com/
Viva o Livro! Viva a Leitura! Viva Monteiro Lobato!
Foto: Victor Vargas/Guanabara-Kirimurê

Conto: "O semeador de tâmaras"

Esta versão vem do livro El saber es más que la riqueza, de  Silvia Dubovoy O semeador de tâmaras Em um oásis perdido no deserto, o velho El...